Aspectos processuais-constitucionais do princípio da causalidade em mandado de segurança e as cláusulas jurídicas indeterminadas (?): súmulas vinculantes, repercussão geral e jurisprudência dominante. Análise crítica na Constituição
“A interpretação é a sombra que segue o corpo. Da mesma maneira que nenhum corpo pode livrar-se da sua sombra, o Direito tampouco pode livrar-se da interpretação” (ROYO, Javier Perez. Curso de Derecho Constitucional, pp. 97/98. Apud BONAVIDES, 2006, p. 579).
RESUMOEste trabalho visa discutir as inconstitucionalidades materiais das súmulas 105 do Superior Tribunal de Justiça e 512 do Supremo Tribunal Federal, ambas negando o recolhimento dos honorários advocatícios em mandado de segurança e tidas, pois, como ato normativo emanado de órgão jurisdicional regulamentando omissão da Lei 1.533/51 e suprimindo o art. 20 do Código de Processo Civil como aplicação subsidiária na espécie. Há impossibilidade na manutenção “das coisas como estão” em virtude de ofensa à Constituição Federal, notadamente dos princípios cardeais previstos expressa ou implicitamente em seu bojo. Reformas pontuais na lei infraconstitucional e na Constituição são abordadas como complemento, à luz da doutrina e jurisprudência, destacando-se, aliás, os institutos das súmulas vinculantes, repercussão geral e jurisprudência dominante, propondo-se a utilidade e adequação do procedimento a ser adotado para sanar as inconstitucionalidades das referidas súmulas, quer no caso concreto, incidentalmente, quer no controle concentrado de constitucionalidade da norma, recomendando-se, inclusive, a iniciativa de cada advogado, de per si, e, ainda e com maior razão, pela entidade de classe que queda-se inerte até o momento.
TASSUS DINAMARCO
Antes de adentrar ao tema proposto, mister identificar a origem do mandado de segurança no direito brasileiro, no tempo e no espaço.
Registra Maria Sylvia Zanella Di Pietro que “O mandado de segurança foi previsto, pela primeira vez, na Constituição de 1934, desapareceu na Constituição de 1937 e voltou na Constituição de 1946. Ele surgiu como decorrência do desenvolvimento da doutrina brasileira do habeas corpus. Quando a Emenda de 1926 restringiu o uso dessa medida às hipóteses de ofensa ao direito de locomoção, os doutrinadores passaram a procurar outro instituto para proteger os demais direitos. Sob inspiração dos writs do direito norte-americano e do juicio de amparo do direito mexicano, instituiu-se o mandado de segurança. Está hoje previsto no art. 5º, LXIX, da Constituição e disciplinado pela Lei nº 1.533, de 31-12-51”[1].
Depois de identificar sumariamente o instituto, iniciarei minha proposta: demonstrar a inconstitucionalidade das súmulas[2] 512 do Supremo Tribunal Federal e 105 do Superior Tribunal de Justiça, ambas negando o recolhimento de honorários advocatícios em mandado de segurança, individual e coletivo[3].
Registro que a súmula 512 foi aprovada pelo Supremo Tribunal Federal em 1969 e a súmula 105 aprovada pelo Superior Tribunal de Justiça em 1994. Estes diferentes momentos[4], à luz de cada ordenamento constitucional vigente na data de sua publicação, serão explorados gradativamente segundo a Teoria da Constitucionalidade, demonstrando-se suas respectivas inconstitucionalidades diante do vigente ordenamento jurídico e o meio processual adequado para que se afaste a aplicabilidade de cada uma delas[5].
Por força da súmula 512 do Supremo Tribunal Federal não cabe condenação em honorários de advogado na ação de mandado de segurança[6]. A súmula 105 do Superior Tribunal de Justiça, sem inovação, também afirma que na ação de mandado de segurança não se admite condenação em honorários advocatícios[7].
A doutrina e a jurisprudência se debatem em admitir ou não a incidência de honorários advocatícios em mandado de segurança, controvérsia, aliás, apontada por Pedro Lenza[8] e Humberto Theodoro Júnior[9], exemplificativamente.
Trazendo hipóteses em que não há obrigação pelo custo do processo, Cândido Rangel Dinamarco lembra que “No mandado de segurança prepondera a isenção do impetrante e do impetrado por honorários (Súmulas 512 STF e 105 STF [SIC]), mas o impetrante tem todos os ônus de adiantamento de despesas. Se a decisão for-lhe desfavorável, responderá por elas afinal, sendo condenado a recolher o que faltar. Ao impetrado raramente são impostas as custas em caso de sucumbência, porque na maioria dos casos ele é um agente estatal e a Fazenda Pública é isenta dessa obrigação; mas o ente estatal a que pertence o impetrado é condenado a restituir ao impetrante o valor dos preparos feitos”[10].
Sobre a gratuidade do processo em mandado de segurança, com análise sistemática das leis infraconstitucionais que regulam a matéria, vide meu ensaio “DEFESA DA CIDADANIA”[11].
De fato, já decidiu o Supremo Tribunal Federal: “Embargos de declaração. Embargos recebidos para explicitar que, a teor da Súmula 512, do STF, não cabe condenação em honorários advocatícios na ação de mandado de segurança”[12]; “Cancelamento da condenação do Estado em honorários advocatícios, descabimento em ação de mandado de segurança (Súmula 512)[13]”; “Quanto a condenação em honorários (Súmula 512). Recurso extraordinário conhecido em parte, e provido para se excluir a condenação em honorários advocatícios”[14].
Reconhecendo a juridicidade da condenação em honorários advocatícios em mandado de segurança, e, mesmo assim, adotando posição jurisprudencial dominante com supedâneo em julgado proferido pela Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça[15], entendimento que adota “para não retardar ainda mais a entrega da prestação jurisdicional”[16], José Roberto dos Santos Bedaque[17].
Segundo Bedaque[18], ao comentar o art. 20 do Código de Processo Civil, “inexiste razão plausível para beneficiar o sucumbente com a isenção desse ônus. Embora previsto em lei especial, o processo instaurado pelo exercício da ação mandamental deve submeter-se às regras e aos princípios gerais referentes à responsabilidade pelas custas e honorários: responde pelas despesas processuais a parte que deu causa ao processo. O mandado de segurança, é certo, constitui um dos mecanismos constitucionais de tutela dos direitos. Mas o princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional, que assegura a todos o ingresso em juízo, também tem sede na Constituição. Da mesma forma, é constitucional a garantia da ampla defesa. Nem por isso deixa de responder pelo ônus da sucumbência aquele que, valendo-se desses direitos constitucionais, participa de relação jurídica processual e obtém resultado desfavorável. O mesmo deveria ocorrer, portanto, com o mandado de segurança, cuja peculiaridade, em comparação com os demais processos, reside apenas na maior celeridade procedimental, decorrente da natureza especial do direito material a ser tutelado”[19].
Sem embargo da expedição das súmulas 512 do STF e 105 do STJ, já foi decidido pelo próprio Superior Tribunal de Justiça a admissão dos honorários advocatícios em mandado de segurança[20].
O mesmo Superior Tribunal de Justiça, relator o ministro Humberto Gomes de Barros, admitiu a condenação da parte vencida em honorários advocatícios em mandado de segurança: “Processual civil. Mandado de segurança. Honorários advocatícios. Cabimento. Entendimento majoritário. Interpretação do Enunciado n.º 512 da Súmula da jurisprudência predominante no colendo Supremo Tribunal Federal. I - coisa essencialmente viva, o direito ultrapassa os limites interpretativos que vão se tornando tradicionais, para, atualizado o conteúdo da lei, buscar no domínio axiológico o seu sentido finalístico, através de encadeamentos visualizadores do que seja justo e razoável. II - O ato de aplicar a lei ao caso concreto não se resume à subsunção a pragmática das sentenças judiciais anteriores mas que se tenha também como presentes os ensinamentos relevantes da doutrina científica do direito, fonte subsidiária e elemento revalorizador de todos os julgados. III - A lei do mandado de segurança não contém nenhum dispositivo que restrinja, explicitamente, a aplicação do princípio da sucumbência. Não é lógico nem justo que o impetrante vitorioso na contenda, depois de ter direito líquido e certo agredido, após passar por todos os conhecidos e naturais aborrecimentos, sempre presentes ínsitos mesmos, em todas as pelejas judiciais, ainda sofra uma diminuição patrimonial, tendo que arrostar com a remuneração do trabalho do seu patrono. IV - Condenar o vencido em todas as parcelas da sucumbência, é, sem dúvida, a solução mais conveniente, na medida em que, por um lado, refreia o uso impertinente do mandamus pelo particular, e, por outro lado, estimula a autoridade a decidir, em instâncias administrativas de modo mais refletido, sobre postulações eventualmente envolventes de direito líquido e certo. V - Recurso conhecido e improvido”[21].
Acolhendo o princípio da causalidade[22] em fase executiva do processo[23], demonstrando-se que o sentido ontológico do instituto é o de que aquele que perde paga, independentemente, agora, da fase judicial em que isso ocorra, decidiu o Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo[24]: “HONORÁRIOS – FIXAÇÃO – FASE EXECUTÓRIA – Despesas de Condomínio – Ação de Cobrança. Decisão de Primeiro Grau que indeferiu o pedido de fixação de verba honorária para a fase de execução, sob o fundamento de que a mesma só seria cabível se houvesse a oposição de Embargos. Recurso provido, para o fim de reformar a r. decisão hostilizada, deferindo a nova fixação de honorários para a atual fase do processo, independente a oposição de Embargos”[25].
Na comarca de Santos[26], precisamente na fase executiva, iniciei o patrocínio em um processo no qual o réu permaneceu revel durante toda a fase de conhecimento, tendo que impugnar[27], em síntese, “penhora incorreta” nos termos do § 1º do art. 475-J combinado com o inc. III do art. 475-L, ambos do Código de Processo Civil[28]. Mesmo antes da recente decisão do Superior Tribunal de Justiça ao admitir o recolhimento dos honorários advocatícios na fase executiva[29], já defendia que o advogado faz jus ao levantamento pecuniário pelo seu trabalho a título de condenação por sucumbência da parte contrária segundo a cláusula geral prevista no art. 20 do Código de Processo Civil, reforçada com a reforma operada pela Lei 11.232. Com efeito, requeri naquela oportunidade, no bojo da impugnação[30], a condenação do autor-exeqüente em honorários advocatícios. Se o executado[31] sair-se vitorioso, ao final da demanda, precisamente com o trânsito em julgado, haverá direito incontestável quanto aos honorários advocatícios. Independentemente de se tratar de fase executiva ou processo executivo, o certo é que houve trabalho do profissional, devendo ser, destarte, proporcionalmente arbitrado pelo magistrado a alíquota decorrente de lei cuja base de cálculo é o valor da causa, entre o mínimo de dez por cento (10%) e o máximo de vinte por cento (20%) sobre o valor da condenação, atendidos: a) o grau de zelo do profissional; b) o lugar de prestação do serviço; e c) a natureza e importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço[32].
André Ramos Tavares, em sintonia com a posição minoritária e lembrando a origem do entendimento que nega sucumbência em mandado de segurança, ou seja, o antigo Código de Processo, de 1.939, quando condicionava a sucumbência à ação resultante de dolo ou culpa, contratual ou extracontratual, afirma: “Poder-se-ia, contudo, adotar a sucumbência, especialmente nas hipóteses em que o impetrante tenha êxito na ação. Contudo, haveria, na hipótese, de se conceder idêntico benefício ao Estado, sob pena de violação do princípio constitucional da igualdade e do contraditório”[33].
Admitindo a sucumbência mediante honorários advocatícios, Nelson Nery Junior diz que “Concedida a ordem, o impetrante deve ter assegurada a restitutio in integrum de seu direito líquido e certo violado por ato ilegal ou abusivo de autoridade, assim reconhecido pelo Poder Judiciário. Por esta razão tem ele direito aos honorários de advogado, porque não se concebe que o poder público prejudique seu direito, o obrigue a impetrar MS em juízo e, ainda assim, pague pelas despesas a que não deu causa. Por outro lado, não se pode exigir do impetrante o pagamento de honorários de advogado quando denegada a ordem, porque isto inibiria o exercício legítimo do writ, apequenando o instituto constitucional que deve ter seu exercício facilitado. A condenação, portanto, seria secundum eventum litis: apenas se concedida a ordem”[34].
No mesmo sentido: José Carlos Barbosa Moreira[35], Celso Agrícola Barbi[36], Yussef Said Cahali[37], Rodolfo de Camargo Mancuso[38] e Eduardo Augusto Jardim[39], dentre outros.
Ressalte-se que o ministro do Supremo Tribunal Federal Marco Aurélio proferiu voto no sentido de que os honorários advocatícios possuem natureza jurídica alimentar: “A definição contida no § 1º-A do artigo 100 da Constituição Federal, de crédito de natureza alimentícia, não é exaustiva. (...). Conforme o disposto nos artigos 22 e 23 da Lei n. 8.906/94, os honorários advocatícios incluídos na condenação pertencem ao advogado, consubstanciando prestação alimentícia cuja satisfação pela Fazenda ocorre via precatório, observada ordem especial restrita aos créditos de natureza alimentícia, ficando afastado o parcelamento previsto no artigo 78 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, presente a Emenda Constitucional n. 30, de 2000.”[40].
Por isso, que fique bem claro que a verba honorária do advogado se inclui no conceito de crédito de natureza alimentícia por força do § 1.°-A do art. 100 da Constituição Federal[41].
Mesmo assim, no que pese o currículo dos que defendem o cabimento dos honorários advocatícios em mandado de segurança, os tribunais superiores continuam negando, majoritariamente, o princípio da causalidade: i) seja nas hipóteses de tutela individual (art. 5.º, inc. LXIX, da CF); ii) seja nas tutelas coletivas (art. 5.º, inc. LXX, da CF); iii) seja quando há atividade processual do advogado como representante da parte (art. 36, caput, do CPC); iv) ou mesmo postulando em causa própria (art. 36, caput, do CPC).
Comentando a legislação infraconstitucional, Cândido Rangel Dinamarco ensina que “O mandato é contrato presumidamente oneroso e sua execução gera o direito do advogado aos honorários ajustados, a serem pagos pelo cliente, bem como àqueles a que for condenada a parte contrária (art. 20 CPC e arts. 22-23 EA); aqueles, em falta de ajuste, serão arbitrados judicialmente em processo contencioso distinto do processo em que os serviços houverem sido prestados (EA, art. 22, § 2.º). Em relação aos honorários da sucumbência, o advogado é legitimado em nome próprio a cobrá-los judicialmente ao vencido, visto que em princípio lhe pertencem (EA, art. 23). O contrato de honorários tem eficácia de título executivo, propiciando a execução forçada independentemente de prévia condenação do ex-cliente, desde que dele próprio se extraia o valor certo da obrigação, sem necessidade de buscar aliunde elementos para essa determinação (liqüidez do crédito: EA, art. 23; CPC, arts. 583, 586 etc.). São distintos e regidos de modos diferentes o direito à remuneração a ser paga pelo cliente e o direito aos honorários da sucumbência. Mesmo quando oficia como defensor dativo, em casos de assistência judiciária, o advogado faz jus a honorários: pagá-los-á o Estado, à vista dos mapas que periodicamente lhe são enviados (EA, art. 22, § 1.º)”[42].
A estatura alcançada pela sucumbência advinda de condenação em honorários advocatícios, cujo batismo já denuncia sua ingerência no ordenamento jurídico num grau mais profundo do que a simples norma positiva em sentido estrito revela inegavelmente que se trata de princípio em nosso sistema o recolhimento, pelo advogado, da verba honorária, recebendo legitimamente o nome “princípio da causalidade” sem embargo de outros que podem ser adotados pelos juristas e sem que seja enunciada outra coisa senão “pagar o que se deve” ao profissional legalmente habilitado em processo judicial.
Paulo Bonavides se debruçou sobre o tema “Princípios Gerais de Direito”/“Princípios Constitucionais”, buscando na doutrina alienígena e brasileira o elo e o atestado de sua normatividade, que se acha na própria Constituição, produzindo largo estudo com Luís-Diez Picazo, Felipe Clemente de Diego, Norberto Bobbio, Riccardo Guastini, Erik Wolf, Joaquín Arces y Flórez-Valdés, García de Enterria, José M. Rodriguez Paniagua, Ronald Dworkin, Jean Boulanger, Joseph Esser, Emilio Betti, Eberhard Grabitz, Feuerbach, Karl Larenz, Vezio Crisafulli, Domenico Farias, Ferruccio Pergolesi, Robert Alexy, Trabucchi, Gomes Canotilho, Alexandre Peczenick, Agustín Gordillo, Sergio Fois, Jorge Miranda e Eros Grau[43].
Herdados o alcance e significado do princípio em tela, todo o caminhar deste ensaio já ganha, com expressão, ares de constitucionalidade: não só pela atividade jurisdicional aberta pela ferida da lide iniciada pela garantia constitucional da ação como também pelo próprio direito material abrigado pela Constituição Federal ao prever como garantia fundamental do Estado Republicano os valores sociais do trabalho (arts. 1.º, inc. IV, 5.º, inc. XIII, e art. 6.º, ambos da CF), da igualdade perante a lei, sem distinção de qualquer natureza (art. 5.º, caput, da CF), da livre expressão da atividade intelectual e científica, independentemente de censura ou licença (art. 5.º, inc. IX, da CF), do direito de propriedade (art. 5.º, caput, e inc. XXII, da CF), do próprio mandado de segurança, preventivo ou repressivo, individual ou coletivo (art. 5.º, incs. LXIX, LXX e LXXVII, da CF), do princípio da moralidade administrativa (art. 37, caput, da CF), da indispensabilidade do advogado à administração da Justiça (art. 133 da CF), e, ainda, da ordem econômica fundada na valorização do trabalho humano (art. 170, caput, da CF em complemento aos arts. 1.º, inc. IV, 5.º, inc. XIII, e art. 6.º, cit.), sem prejuízo de outras disposições constitucionais esparsas pela Carta Magna.
Todos esses princípios, porém, direta ou indiretamente, são afetados quando é negada a sucumbência em honorários advocatícios em mandado se segurança: i) o valor social do trabalho por cortar ou diminuir a investida do profissional nas situações em que a relação entre o poder público e o particular é estremecida pela ausência da via mandamental que poderia ser ajuizada, imprescindível na prevenção ou remoção do ilícito administrativo causado por ilegalidade ou abuso de poder em face de atos vinculados e discricionários da Administração; ii) a igualdade no sentido de que demandar contra o Estado na expectativa de ver prevenida ou sanada ilegalidade ou abuso de poder, cometidos pelo Poder Executivo, Legislativo ou pelo próprio Poder Judiciário, não pode ter tratamento desigual perante as demais ações em que haja a postulação do advogado e se dirija ao ente privado. Apesar da gratuidade brotada no texto constitucional e legislação infraconstitucional, certamente a parte encontra dificuldades ou paga mais ao contratar o profissional, ciente este último de que os honorários advocatícios não serão mais tarde compensados pela sucumbência provinda de condenação, inata àquele que perde na dialética do litígio, arcando não só com honorários, mas, também, com custas processuais como normalmente ocorre. De outra banda, há dispêndio de orçamento público para custear as atividades alcançadas pela mitigada gratuidade na tutela dos direitos em mandado de segurança, remunerando-se os d. procuradores que defendem o poder público em juízo ou fora dele segundo a Lei Orgânica de cada ente político e respectivas Fazendas. É de se lembrar, ainda, que provocar a imparcialidade da jurisdição mediante o exercício constitucional da ação (art. 5.º, inc. XXXV, da CF) deve ter tratamento igual, independentemente de quem seja o pólo passivo na lide, não havendo razoabilidade constitucional para que o poder público assanhadamente fique são e salvo caso seja demandado em mandado de segurança e, ao final, tenha o particular a ordem concedida pelo Estado-juiz sem que a respectiva Fazenda suporte os custos da demanda, não arcando, pois, com sua responsabilidade civil perante terceiros e afetando, também, a garantia constitucional do direito de ação ou da inafastabilidade da jurisdição, indiretamente; iii) a livre expressão da atividade intelectual e científica, independentemente de censura ou licença, por estar o poder público, indiretamente, diminuindo a investida dos advogados em impetrar mandados de segurança em favor de terceiros, inibidos estes últimos em contratar o profissional acaso o fim almejado pelo writ não seja, aritmeticamente (relação de custo-benefício), muito superior se comparado aos custos que se tem na utilização da ação mandamental. Se assim não for, o particular deixa ou é muito desestimulado em impetrar o “remédio constitucional” (v. José Afonso da Silva[44]) por entender que o custo não compensa o risco do litígio; iv) o direito de propriedade na medida em que a remuneração pecuniária paga ao advogado relativamente ao seu múnus é, nos termos do direito privado e mesmo do direito público, considerado como bem integrante de seu patrimônio e protegido pela Constituição; v) o direito constitucional - legítima expressão da cidadania em sentido estrito - na utilização do mandado de segurança, pois ao ser previsto pelo texto pétreo da Constituição a ação mandamental, a garantia deve ser efetivada, o que se dá, todavia, não impedindo direta ou indiretamente a parte em se utilizar dessa ação, cuja norma tem que ter interpretação larga. Ora, é pró-forma a circunstância de o impetrante pôr no corpo de suas razões o valor da ação - ou de alçada - se o poder público, ao ter que cumprir a ordem, não for condenado proporcionalmente à base de cálculo e alíquota lançada nos autos; vi) a observância do princípio da moralidade administrativa, exigindo-se, em suma, que o Estado aja segundo os ditames da probidade e boa-fé, não se permitindo, por outro lado, que o poder público se abstenha de pagar honorários advocatícios sem que cometa inconstitucionalidade material esgarçada pela ilegalidade desse ato; vii) a indispensabilidade do advogado na administração da Justiça, norma constitucional de onde se extrai a máxima de que “quem trabalha tem que ganhar” segundo o regime capitalista vigente, o que se dá somente quando a parte, titular do pólo ativo em mandado de segurança, vê possibilidade de retorno em face da investida que fez - visando uma tutela imediata ou mediata através da via mandamental - ao contratar advogado para que represente seus direitos perante o Poder Judiciário; viii) a ordem econômica fundada na valorização do trabalho humano, pelo fato de que inibir a irrestrita atividade da advocacia, mesmo quando se tenta proteger os interesses pecuniários do Estado, denota, sem rodeios, cerceamento de atividade lícita e constitucionalmente prevista como pilar da república brasileira.
Cabe analisar as súmulas 512 do Supremo Tribunal Federal e 105 do Superior Tribunal de Justiça à luz dos dispositivos que dão mais eficácia às decisões destes tribunais superiores[45], impedindo, com isso, a subida do processo que discuta a aplicabilidade dos honorários advocatícios em mandado de segurança, posicionamento majoritário na doutrina e jurisprudência conforme já foi dito.
Impetrado o mandamus e concedida a ordem sem que seja recolhido os honorários advocatícios em primeira instância, desde que pedido expressamente pelo advogado como forma de prequestionamento do crédito (inclusive com a utilização do recurso de embargos de declaração, se preciso for), de caráter alimentar e de peso constitucional, qual via processual pode ser tomada pelo advogado legitimado para a causa no fito de receber seus honorários, afastando-se o obstáculo criado pelas citadas súmulas? Deve o profissional litigar no mesmo processo onde se iniciou os autos ou em via própria? Como fica o pólo da lide relativamente ao interesse de agir do advogado em querer ver seus honorários recolhidos? O processo se resolve em relação à parte?
Nos termos do art. 499, caput, do Código de Processo Civil, ao tratar das disposições gerais dos recursos, “O recurso pode ser interposto pela parte vencida, pelo terceiro prejudicado e pelo Ministério Público”. § 1.° “Cumpre ao terceiro demonstrar o nexo de interdependência entre o seu interesse de intervir e a relação jurídica submetida à apreciação judicial”. A Lei 8.906/94, que dispôs sobre o Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), prevê em seu art. 23 que “Os honorários incluídos na condenação, por arbitramento ou sucumbência, pertencem ao advogado, tendo este direito autônomo para executar a sentença nesta parte, podendo requerer que o precatório, quando necessário, seja expedido em seu favor”[46] (destaquei). Em seguida, o art. 24, caput, fala que “A decisão judicial que fixar ou arbitrar honorários e contrato escrito que os estipular são títulos executivos e constituem crédito privilegiado na falência, concordata, concurso de credores, insolvência civil e liquidação extrajudicial”[47] (destaquei). § 1º. “A execução dos honorários pode ser promovida nos mesmos autos da ação em que tenha atuado o advogado, se assim lhe convier” (destaquei).
Interpretadas tais normas em harmonia (sistemática e teleologicamente), se extrai que o advogado, quando atua em mandado de segurança, postulando direito líquido e certo da parte, pode promover a execução “nos próprios autos do processo”, sem necessidade de ajuizar ação própria discutindo a verba honorária[48]. O advogado não é parte em mandado de segurança quando atua postulando direito alheio, não podendo, com razão, ostentar qualidade de parte propriamente dita. Sua atividade na ação mandamental é de representante legal nos termos do art. 36, caput, do Código de Processo Civil, o impedindo de apelar da sentença concessiva da ordem de segurança e que lhe negou a sucumbência honorária na ação constitucional por ausência de interesse de agir[49]. Tal posicionamento não é unânime.
Aplica-se, assim, os dispositivos previstos no EOAB citados, não sendo aplicado o art. 499, caput, e § 1.°, do CPC, em se tratando do “interesse de agir do advogado”, que é específico em relação ao código processual[50], tocando o processo, destarte, como “terceiro prejudicado” em relação ao fundamento jurídico da demanda originária (mandado de segurança) e “parte propriamente dita” na demanda secundária ou subsidiária à principal, valendo-se, pois, do Estatuto da Ordem dos Advogados. A partir da exclusão da parte originária do litígio, depois de atingido seu interesse processual e tendo o advogado iniciado sua execução no fito de obter seus honorários decorrentes da aguardada condenação judicial, que não reconheceu sua incidência à revelia da melhor interpretação constitucional, sem dúvida que um novo litígio, sob novo fundamento, é instaurado.
Com relação à parte no originário litígio (mandado de segurança), depois de concedida a ordem, deixa ela o pólo do processo por ter esgotada sua pretensão com a tutela julgada procedente em seu favor considerando-se a hipótese e resolvendo-se, com isso, o mérito do processo para esse sujeito processual ex vi do art. 269, inc. I, do CPC, na redação da Lei 11.232, de 22 de dezembro de 2005. Essa a razão da ilegitimidade passiva a posterioriantes postulando pela parte originária e depoisparte propriamente dita do litígio originário, ou seja, o mérito na ação em mandado de segurança. relativamente à parte originária, que deixa o litígio por ter esgotada sua pretensão em juízo, ocorrendo mutação na atividade do advogado: assumindo o pólo ativo do litígio na expectativa de receber o que lhe é devido com fulcro na Constituição. Evidentemente, a parte assistida em mandado de segurança não teria qualquer interesse processual na ação executiva promovida pelo advogado. Por isso a exclusão do pólo ativo, sub-rogado pelo novo legitimado ativo, relativamente à nova causa de pedir cavada pelo pleito em seus honorários, tem o condão de excluir a
Aquilo que antes era mandado de segurança virou “execução de honorários advocatícios”, embora a fonte dessas atividades processuais seja a mesma: a defesa da cidadania iniciada pela impetração do legitimado ativo ad causam; a parte originária ou principal em mandado de segurança nas hipóteses secundum eventum litis.
É fato que ultimamente os tribunais superiores, após algumas reformas na lei infraconstitucional e mesmo na Constituição, distanciaram ainda mais a possibilidade de se discutir a o princípio da causalidade em mandado de segurança.
A edição de súmulas vinculantes, aliás, em muitos casos é imprescindível para frear a litigiosidade extremada dos usuários do Poder Judiciário. Pretensões de cunho estritamente individual não devem chegar aos tribunais superiores, o que se afigura um acerto, data venia àqueles que assim não compartilham deste entendimento. O poder constituído, derivado ou de segundo grau, através da emenda constitucional 45, de 8 de dezembro de 2004, noticiada pela mídia como A REFORMA DO PODER JUDICIÁRIO, trouxe novas disposições ao § 2º e acrescentou um § 3º ao art. 102 da Constituição Federal, prevendo neste último caso o instituto da repercussão geral como requisito objetivo no recurso extraordinário, cuja regulamentação ficou ao talante da lei ordinária.
Mas em se tratando de princípio afeto à advocacia[51], atividade essencial à função jurisdicional do Estado (art. 133 da CF), negar o recolhimento da verba honorária significa, sem dúvida, causa suficientemente econômica, política, social e jurídica[52], ultrapassando os interesses subjetivos da demanda iniciada pelo mandado de segurança. Não se está discutindo somente interesse privado - alimentar, cujo assento é a própria Constituição! - e sim interesse de toda uma coletividade. Afetar o interesse dos advogados, com efeito, significa afetar o interesse do bom funcionamento da Justiça por que o reflexo da inibição ou mesmo abandono da parte que é desestimulada em procurar seus direitos se valendo da postulação do profissional, violentado pelo corte das súmulas 512 do STF e 105 do STJ, traz à tona repercussão suficientemente encontrada nas inovações do sistema que pretenderam coibir a jurisdição destas Cortes em querelas meramente individuais. Esse debate sobre a causalidade em mandado de segurança requer outro conceito, outra axiologia normativo-constitucional. Estou falando do interesse “econômico, político, social e jurídico”, transcendências da repercussão geral incidentes na espécie e atinentes ao interesse coletivo da advocacia[53], representando, em seu conjunto, o interesse público.
O Supremo Tribunal Federal, segundo noticia seu portal eletrônico, já julgou o mérito de cinco temas com repercussão geral[54]: “STF já julgou o mérito de cinco temas com repercussão geral. ‘Desde o dia 30 de abril de 2008, quando o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) julgou pela primeira vez um Recurso Extraordinário (RE) submetido ao filtro da repercussão geral, cinco temas relevantes já foram decididos pela Corte, em sede de Recurso Extraordinário. A importância dos temas decididos definitivamente pelo Supremo, nos recursos extraordinários, fica comprovada na edição das últimas súmulas vinculantes, uma vez que as matérias discutidas nos processos foram sumuladas. O dispositivo da repercussão geral, criado em 2004 pela Emenda Constitucional 45, possibilita que o Supremo deixe de apreciar recursos extraordinários que não tenham maiores implicações para o conjunto da sociedade. É um filtro que permite ao STF julgar somente os recursos que possuam relevância social, econômica, política ou jurídica. Ao mesmo tempo, determina que as demais instâncias judiciárias sigam o entendimento da Suprema Corte, evitando o encaminhamento de milhares de processos idênticos ao STF. No julgamento do Recurso Extraordinário 565714 o Plenário decidiu negar provimento ao recurso por entender que a vinculação do adicional de insalubridade ao salário mínimo ofende a Constituição Federal, mas a alteração da base de cálculo por via de interpretação jurídica não é possível. Este foi o primeiro RE em que foi reconhecida a repercussão geral. A ação, proposta na primeira instância por policiais militares paulistas, pretendia que o estado passasse a usar, como base de cálculo do adicional por insalubridade, o total dos vencimentos recebidos pelos servidores, e não o salário mínimo, como determinava a Lei Complementar 432/85, de São Paulo. Portanto, a Súmula Vinculante repetiu a conclusão do julgamento do RE, isto é, mantendo o salário mínimo como indexador e base de cálculo do adicional de insalubridade até a edição de nova lei. Súmula Vinculante nº 4. ‘Salvo os casos previstos na Constituição Federal, o salário mínimo não pode ser usado como indexador de base de cálculo de vantagem de servidor público ou de empregado, nem ser substituído por decisão judicial’. Serviço militar e remuneração abaixo do salário mínimo. Ao julgar o Recurso Extraordinário (RE) 570177, o STF reconheceu a repercussão geral do tema e entendeu que é constitucional o pagamento de valor inferior ao salário mínimo para os jovens que prestam serviço militar obrigatório. O RE foi interposto por um recruta contra a União e alegava que o pagamento de valor inferior ao mínimo violava o disposto nos artigos 1º, incisos III e IV; 5º, caput; e 7º, incisos IV e VII, da Constituição Federal. Os ministros entenderam que os militares se submetem a um regime jurídico próprio que não se configura com os servidores públicos civis. Súmula Vinculante nº 6. ‘Não viola a Constituição o estabelecimento de remuneração inferior ao salário mínimo para as praças prestadoras de serviço militar inicial’. Contribuição social - prazo para recolhimento. No julgamento dos REs 556664, 559882, 559943 e 560626, os ministros do STF decidiram, por unanimidade, declarar a inconstitucionalidade dos artigos 45 e 46 da Lei 8.212/1991, por entender que apenas lei complementar pode dispor sobre normas gerais em matéria tributária – como prescrição e decadência, incluídas aí as contribuições sociais. No julgamento desses recursos o Plenário decidiu declarar a inconstitucionalidade de normas que fixavam prazos diferentes de prescrição e decadência de contribuições sociais, assim, a União não pode cobrar, em nenhuma hipótese, fora dos prazos previstos no CTN para todos os tributos. Já os contribuintes que não pagaram, não precisam pagar mais. Quanto aos contribuintes que pagaram, há modulação de efeitos diferenciando duas hipóteses: a) Quem pagou no prazo estendido, mas impugnou antes do julgamento de 11/06/08: pode receber a devolução (efeitos ex tunc da decisão de inconstitucionalidade, ou seja, passam a valer desde a edição da lei); b) Quem pagou no prazo estendido e não impugnou até 11/06/2008: não tem direito de receber a devolução (efeitos ex nunc da decisão de inconstitucionalidade, isto é, os efeitos valem a partir da decisão). Daqui para frente todo contribuinte que no futuro pagar fora do prazo pode pedir a devolução por pagamento indevido. Súmula Vinculante nº 8. ‘São inconstitucionais os [SIC] parágrafo único do artigo 5º do Decreto-lei 1569/77 e os artigos 45 e 46 da Lei 8.212/91, que tratam de prescrição e decadência de crédito tributário’. Agilidade no julgamento da repercussão geral. No julgamento dos REs 580108 e 582650, a maioria dos ministros aplicou uma questão de ordem levantada pela ministra Ellen Gracie, na qual ficou entendido que a repercussão geral será reconhecida pelo Plenário da Corte a recursos extraordinários que discutem matérias já pacificadas pelo STF, sem que esses processos tenham de ser distribuídos para um relator. Assim, os recursos extraordinários que versem sobre matérias já julgadas pelo STF serão enviados para a Presidência do STF, que levará a questão ao Plenário antes da distribuição do processo. Caberá aos ministros, no julgamento colegiado, aplicar a jurisprudência da Corte; rediscutir a matéria ou; simplesmente, determinar o seguimento normal do recurso, caso se identifique que a questão não foi ainda discutida pelo Plenário. Reserva de Plenário - Declaração de Inconstitucionalidade. O RE 580108 trata do dispositivo constitucional que dispõe sobre a reserva de plenário. Nela se determina que, somente pelo voto da maioria absoluta de seus integrantes, os tribunais podem declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público. A edição de súmula vinculante sobre este tema encontra-se em análise pela Corte. Aplicação do antigo limite de juros a 12% ao ano. Já o julgamento do RE 582650 resultou na Súmula Vinculante nº 7, na qual ficou decidido que o parágrafo 3º do artigo 192 da Constituição Federal, um dispositivo que já foi revogado e que limitava a taxa de juros reais a 12% ao ano, tinha sua aplicabilidade condicionada à edição de lei complementar. Ou seja, determina que esse dispositivo da Constituição não era auto-aplicável. A partir da data de sua publicação no Diário de Justiça, a nova súmula vinculante passará a ser aplicada a todos os processos que versem sobre essa questão. Súmula Vinculante nº 7. ‘A norma do parágrafo 3º do artigo 192 da Constituição, revogada pela Emenda Constitucional 40/2003, que limitava a taxa de juros reais a 12% ao ano, tinha sua aplicabilidade condicionada à edição de lei complementar’”[55].
Voltando, nada impede que o advogado provoque o pretório excelso através do recurso extraordinário para que a Corte decida a respeito dos honorários advocatícios em mandado de segurança decorrentes do princípio da causalidade pois preenchidos estão os novos requisitos de admissibilidade desta via excepcional à jurisdição constitucional. Aliás, exige-se cuidado com o § 3° do art. 543-A do CPC instituído pela mesma lei, onde se lê: “Haverá repercussão geral sempre que o recurso impugnar decisão contrária a súmula ou jurisprudência dominante do Tribunal”. Existindo “súmulas simples” e jurisprudência dominante no sentido da inadmissão à verba honorária de advogado em mandado de segurança, à primeira vista se poderia alegar de igual modo inadmissão à subida de recurso extraordinário cujo arrazoado seria a peleja do princípio da causalidade.
Muito embora existam súmulas (“simples” ou “não-vinculantes”) e jurisprudência dominante a respeito, negar esse direito ao profissional é quebrar a medula óssea do sistema positivo, oculto por ato normativo do Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal nas hipóteses das súmulas 105 e 512.
É preciso interpretar a restrição do § 3° do art. 543-A do CPC “com um grão de sal”. Por não existir direito absoluto, ainda que fundamental, como, por exemplo, os que constam no rol do art. 5º da Constituição, também não há, por interpretação lógica, lei infraconstitucional absoluta. Lembre-se que a Lei 11.418 regulamentou um dispositivo constitucional e que só por esse motivo deve ceder no choque com princípios que têm seu DNA na Constituição, revestidos de maior razoabilidade na tarefa de interpretação da norma. Não é lícito, de fato, afastar um princípio constitucional fundamental mediante a simples regulamentação ordinária de texto constitucional derivado (emenda constitucional) ou mesmo de texto constituinte estranho ao Título II, Capítulos I, II, III, IV e V, abrigo de garantias fundamentais na Constituição formal, característica imanente de constituições rígidas[56] segundo classificação doutrinária comumente adotada.
A uniformização da jurisprudência, ademais, é questão de direito relativo. É o que entende Barbosa Moreira, segundo o qual “No exercício da função jurisprudencial, têm os órgãos judiciais de aplicar aos casos concretos as regras de direito. Cumpre-lhes, para tanto, interpretar essas regras, isto é, determinar o seu sentido e alcance. Assim se fixam as teses jurídicas, a cuja luz hão de apreciar-se as hipóteses variadíssimas que a vida oferece à consideração dos julgadores. A fixação de uma tese jurídica reflete entendimento necessariamente condicionado por diversas circunstâncias. Mutável que é a realidade social, compreende-se que mude também, com o correr do tempo, o entendimento das normas de direito, ainda quando permaneça invariável o respectivo teor literal. Nada mais natural, assim, que a evolução da jurisprudência através da constante revisão das teses jurídicas fixadas. Na inércia do legislador – atestam-no conhecidos e abundantes exemplos históricos -, ela funciona como respiradouro indispensável para permitir o progresso do direito e impedir a fossilização dos textos normativos. Conforme se lê em obra clássica, ‘seria absurdo desejar que a jurisprudência, que por sua mutabilidade no tempo é a mais sensível e mais preciosa registradora das oscilações mesmo leves da consciência jurídica nacional, fosse cristalizada e contida em sua liberdade de movimento e de expansão’ [o autor cita CALAMANDREI, La Cassazione Civile, vol. II, in Opere Giuridiche, vol. VII, pág. 74]. Outro é, pois, o fenômeno que se tem em vista quando se alude à conveniência de adotar medidas tendentes à uniformização dos pronunciamentos judiciais. Liga-se ele ao fato da existência, no aparelho estatal, de uma pluralidade de órgãos judicantes que podem ter (e com freqüência têm) de enfrentar iguais questões de direito e, portanto, de enunciar teses jurídicas em idêntica matéria. Nasce daí a possibilidade de que, num mesmo instante histórico – sem variação das condições culturais, políticas, sociais, econômicas, que possa justificar a discrepância -, a mesma regra de direito seja diferentemente entendida, e a espécies semelhantes se apliquem teses jurídicas divergentes ou até opostas. Assim se compromete a unidade do direito – que não seria posta em xeque, muito ao contrário, pela evolução homogênea da jurisprudência dos vários tribunais – e não raro semeiam, entre os membros da comunidade, o descrédito e o cepticismo quanto à efetividade da garantia jurisdicional. Nesses limites, e somente neles, é que se põe o problema da uniformização da jurisprudência. Não se trata, nem seria concebível que se tratasse, de impor aos órgãos judicantes uma camisa-de-força, que lhes tolhesse o movimento em direção a novas maneiras de entender as regras jurídicas, sempre que a anteriormente adotada já não corresponda às necessidades cambiantes do convívio social. Trata-se, pura e simplesmente, de evitar, na medida do possível, que a sorte dos litigantes e afinal a própria unidade do sistema jurídico vigente fiquem na dependência exclusiva da distribuição do feito ou do recurso a este ou àquele órgão”[57].
O sempre autorizado posicionamento de Barbosa Moreira é compatível com o lúcido entendimento que defende a necessidade de se revisitar os fundamentos que o direito emprestou aos julgados que formaram jurisprudência restritiva ao recebimento dos honorários advocatícios ex vi das súmulas 512 do STF e 105 do STJ. Até mesmo jurisprudência dominante ou súmula, inclusive as vinculantes - desde que se demonstre a necessidade de exceção à sua aplicabilidade no caso concreto -, não podem, jamais, vincular o juiz atrelado ao texto constitucional, diploma que é o “carro-chefe” do ordenamento jurídico.
Pugnar pelos honorários advocatícios é pugnar pelo direito ao alimento do profissional cuja formação jurídica não lhe permite - e deve mesmo ser assim - quedar-se inerte quando constatadas ilegalidades e/ou inconstitucionalidades cometidas pelo poder público através de atos normativos de tribunal, como ocorre com as súmulas 512 e 105.
O atual texto do Código de Processo Civil, em seu art. 518, § 1º, voltando à questão das reformas, determina que “O juiz não receberá o recurso de apelação quando a sentença estiver em conformidade com súmula do Superior Tribunal de Justiça ou do Supremo Tribunal Federal”[58].
Barbosa Moreira comentou o art. 518, § 1º, nestes termos: “O novo § 1º, introduzido pela Lei nº 11.276, proíbe o juiz de receber a apelação ‘quando a sentença estiver em conformidade com súmula do Superior Tribunal de Justiça ou do Supremo Tribunal Federal’. Estranhamente, consagrou-se por lei ordinária inovação para a qual antes se reputara indispensável reforma constitucional: a adoção da chamada ‘súmula impeditiva de recurso’ figurava no projeto de que resultou a Emenda Constitucional nº 45, e só não foi incluída nesta porque o Senado Federal não aprovou o texto oriundo da Câmara dos Deputados, à qual se teve de devolver a matéria. É paradoxal, no mínimo, que a Lei nº 11.276, por via indireta, atribua a quaisquer proposições sumuladas pelo Superior Tribunal de Justiça e pelo Supremo Tribunal Federal efeito praticamente equiparável, ou quase, ao da denominada ‘súmula vinculante’ – e mais: sem sequer subordiná-la ao concurso dos pressupostos ali enumerados!”[59]. O mesmo autor, anteriormente à aprovação do Projeto de Lei que resultou o vigente § 1º do art. 518 do CPC, disse, à época, em tópico intitulado “OS NOVOS PROJETOS DE REFORMA DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL”, in “SÚMULA, JURISPRUDÊNCIA, PRECEDENTE: UMA ESCALADA E SEUS RISCOS”: “Ainda outro projeto mira a dar ao art. 518 do estatuto processual um parágrafo a cuja luz ‘o juiz não receberá o recurso de apelação quando a sentença estiver em conformidade com súmula do Superior Tribunal de Justiça ou do Supremo Tribunal Federal’. Fica evidente que se deseja antecipar, por via da legislação ordinária, algo (ou muito) de proposta constante do projeto de reforma da Constituição, na parte que pende da reapreciação pela Câmara dos Deputados, a saber, a denominada ‘súmula impeditiva de recurso’ (supra, item 3). Não deixa isso de ser curioso: ou a inovação prescinde de autorização constitucional, e não se percebe o porquê de sua inserção naquele projeto, ou precisa dela, e simples lei ordinária não pode consagrá-la sem ferir a Carta da República”[60].
Em recente trabalho, abordei o novo art. 543-C do Código de Processo Civil[61], instituído pela Lei 11.672, de 8 de maio de 2008, sua pontual inconstitucionalidade e as questões processuais-constitucionais da nova reforma, remetendo o leitor[62]. Sem dúvida, o acréscimo do art. 543-C faz parte do declarado intuito dos tribunais superiores visando desafogar suas pautas, podendo, em alguma medida, ferir princípios constitucionais como o direito de ação[63], dentre outros.
A Lei 11.417, de 19 de dezembro de 2006, que regulamentou o art. 103-A da Constituição Federal e alterou a Lei 9.784, de 29 de janeiro de 1999, disciplinando a edição, a revisão e o cancelamento de enunciado de súmula vinculante[64] pelo Supremo Tribunal Federal, dando ainda outras providências (ementa e art. 1.º da Lei 11.417), possibilitou que o STF, de ofício ou por provocação, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, edite enunciado de súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, tenha efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceda à sua revisão ou cancelamento, na forma prevista pela lei (art. 2.º da Lei 11.417). Anoto que não foi editada súmula vinculante reproduzindo o sentido das súmulas 512 e 105, respectivamente do STF e do STJ[65], ficando entrementes que tal enunciado situa-se no plano infra-legal, regulamentar, pois se trata de ato normativo de tribunal. Sua força jurídica é menos intensa do que os preceitos sumulados nos termos da Lei 11.417, evidentemente.
Barbosa Moreira vê impropriedade na expressão “súmula vinculante”. Para o processualista, com efeito, “Vale a pena abrir item especial para aquela que é talvez a mais propalada e ambiciosa inovação da Emenda Constitucional nº 45: a impropriamente chamada ‘súmula vinculante’. Digo impropriamente porque a palavra ‘súmula’ sempre se empregou – em perfeita consonância com a etimologia e os dicionários – para designar o conjunto das proposições em que se resume a jurisprudência firme de cada tribunal, a começar pela Corte Suprema, onde ela foi criada, em 1963, sob a denominação correta de Súmula da Jurisprudência Predominante (no singular), com a qual se incorporou ao Regimento Interno. Agora, ela aparece no texto constitucional emendado com a referência a cada uma daquelas proposições, consoante ressalta do teor do novo art. 103-A e também do art. 8º da Emenda, que alude às ‘atuais súmulas do Supremo Tribunal Federal’”[66].
De todo modo, a expressão “súmula vinculante” é empregada pela maioria dos doutrinadores, não só por sua previsão no direito positivo, mas, principalmente, por que foi assim divulgado o instituto pelos meios de comunicação.
Um bom exemplo - voltando ao tema das inconstitucionalidades das súmulas 512 e 105 - de que o STF pode editar súmulas vinculantes, mesmo que o novo enunciado seja originariamente pertencente ao grupo das súmulas sem essa qualificação (as chamadas “súmulas simples”; ou somente “súmulas”), no todo ou em parte, tomando por base texto de determinado enunciado de súmula anterior à instituição da Lei 11.417, é a edição da súmula vinculante nº 7, referentemente à interpretação na aplicabilidade da norma em período de validade, vigência e discutível eficácia em se tratando do derrogado art. 192 da Constituição Federal[67].
Se referindo ao art. 192 e seus efeitos na interpretação da norma, teve o intuito de interpretar as conseqüências advindas da insegurança jurídica que se formou a respeito antes da edição da emenda constitucional 40 de 2003, podendo, de certa forma, fomentar a discussão natural desencadeada por aqueles que se valerão da previsão pétrea do ato jurídico perfeito para atacar a razoabilidade constitucional da súmula vinculante nº 7, podendo ser tida, ainda que seja taxada de contraditio in terminis minha afirmação, como “súmula vinculante inconstitucional”[68] (?!).
Essa “repristinação”[69] ocorrida entre a súmula vinculante nº 7 e o derrogado art. 192 da Constituição, na redação da EC 40, deve ser lida segundo a exortação feita por Barbosa Moreira, literis: “Seja como for, a eficácia vinculante, no texto da Carta da República, tal como resultou da Emenda nº 45, está rigorosamente limitada às hipóteses previstas no art. 103-A e subordinada ao concurso (que o Supremo Tribunal Federal não pode dispensar) dos pressupostos ali enumerados. A inclusão de qualquer proposição sem observância de tais limites e pressupostos violará a Constituição. As proposições que já constavam da Súmula da Corte só adquirirão eficácia vinculante se e quando forem confirmadas por dois terços, no mínimo, dos Ministros (art. 8º da Emenda nº 45) – confirmação que terá de levar em conta os requisitos do art. 103-A, exigíveis com relação àquelas não menos que às proposições supervenientes”[70].
Sobre repristinação, vide meu ensaio “PARCIAL EFEITO REPRISTINATÓRIO TÁCITO NO DIREITO À NACIONALIDADE BRASILEIRA PELA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 54, DE 20 DE SETEMBRO DE 2007”[71].
Existem, atualmente[72], dez súmulas vinculantes[73] editadas pelo Supremo Tribunal Federal. O ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Ferreira Mendes, sobre a positividade do instituto no direito brasileiro, ressalta que “a Súmula Vinculante é um instituto de caráter racionalizador. A aplicação das súmulas desonera não somente o Supremo de uma série de recursos, mas também as instâncias ordinárias”[74].
Só o tempo dirá se a edição das súmulas vinculantes – acaso não hajam reiterados abusos em sua edição, chegando-se ao ponto de existir num futuro não muito remoto um “Código de Súmulas Vinculantes”[75], o que aproximaria o Poder Judiciário do Poder Executivo em seu exercício inflacionário de medidas provisórias! - será boa à administração da justiça, não somente sob o ângulo administrativo puro, de resultados estatísticos, mas, prioritariamente, subsumindo-se à compatibilidade com o ordenamento jurídico positivo e sob a égide de uma democrática e republicana Constituição[76].
Interessa mencionar o § 1° do art. 2º da citada Lei 11.417, onde se lê: “O enunciado da súmula terá por objeto a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas, acerca das quais haja, entre órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública, controvérsia atual que acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre idêntica questão”.
De lege ferenda, e consertando o desacerto das súmulas 512 e 105, poderia o Supremo Tribunal Federal editar súmulas vinculantes com disposições permissivas quanto aos honorários advocatícios em mandado de segurança, dignificando, com isso, a segurança jurídica dos profissionais da advocacia privada à obtenção de seu direito ao alimento corroborado pelo princípio da causalidade incidente naquela via de provocação ao sanar ilegalidade ou abuso de poder cometido por autoridade pública em sua típica função de Estado contra direito líquido e certo de particular[77]. Criada súmula vinculante no sentido de se positivar no ordenamento jurídico o recebimento dos honorários advocatícios em mandado de segurança, o “gatilho estaria ativado” pela classe contra aqueles juízos rebeldes à constitucionalidade e conseqüente cumprimento do art. 7° da Lei 11.417: “Da decisão judicial (...) que contrariar enunciado de súmula vinculante, negar-lhe vigência ou aplicá-lo indevidamente caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal, sem prejuízo dos recursos ou outros meios admissíveis de impugnação”. § 2°: “Ao julgar procedente a reclamação, o Supremo Tribunal Federal (...) cassará a decisão judicial impugnada, determinando que outra seja proferida com ou sem aplicação da súmula, conforme o caso”.
A propósito, o art. 7º da Lei 11.417 foi comentado por André Ramos Tavares, nestes termos: “Se há controvérsia judicial ou administrativa sobre certo tema, e, pois, se há decisões judiciais e administrativas colidentes entre si ou não coerentes, é o caso de editar a súmula vinculante como solução. Se a súmula, apesar de existir, é descumprida, significa que aquele panorama inicial (de decisões díspares pretendendo conviver no mesmo sistema jurídico) é retomado (e potencializada a insegurança dele decorrente, pois a solução do sistema era ela própria inconsistente, e assim será assimilada pelos operadores do Direito e sociedade). É por esse motivo que foi reavivado o instituto da reclamação constitucional”[78]. Afirma o constitucionalista, ainda, que “A reclamação, no caso das decisões proferidas pelo STF, direciona-se, pois, à garantia da autoridade das decisões proferidas pelo STF, perante os interessados, em seus casos concretos”[79], concluindo: “Logo, a reclamação constitucional passou a desempenhar um papel importante no cenário do controle de constitucionalidade brasileiro. E, doravante, em virtude de se ter contemplado expressamente seu cabimento nos casos de descumprimento de súmula vinculante, sua importância será reforçada enquanto instrumento próprio para fazerem-se impor efetivamente as decisões do STF dotadas de eficácia geral e efeito vinculante”[80].
Atrelado ao tema e caminhando para a aguardada conclusão, inicio ponderações sobre a TEORIA DO CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE[81], precisamente sobre ato normativo de tribunal representado pelas súmulas 512 e 105, cit.
A súmula 512 do STF foi aprovada em sessão plenária em 3 de dezembro de 1969[82]. Na época, os ministros do Supremo Tribunal tomaram por inspiração o art. 64 do Código de Processo Civil de 1939, e também a Lei 4.632/1965, tendo como precedentes os recursos extraordinários 61097, 66843, 65572, e o mandado de segurança 19071[83].
A súmula 105 do STJ, por seu turno, foi aprovada pela Corte Especial em 26 de maio de 1994. Os ministros tiveram como referência legislativa o art. 20 do Código de Processo Civil de 1973, e, também, o art. 19 da Lei 1.533/51, tendo como precedentes os recursos especiais 36285, 880, 18649, 27879[84].
Vistos, relatados e discutidos os fundamentos pelos quais tenho por inconstitucionais as súmulas 512 e 105, será abordada, no campo processual, cada respectiva adequação quanto ao procedimento cabível na espécie, depois de atestado o período em que cada ato normativo foi editado por aqueles egrégios tribunais.
Com relação à súmula 105 do STJ, publicada após a promulgação da Constituição de 1988, não vejo muita dificuldade em admitir o cabimento do controle de constitucionalidade, tanto difuso, como concentrado, pelos respectivos legitimados ativos ad causam.
A Lei 9.868, de 10 de novembro de 1999, dispôs sobre o processo e julgamento da ação direta de inconstitucionalidade e da ação declaratória de constitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal, sendo derrogada, quanto aos legitimados ativos[85], pela emenda constitucional 45/04. Exige o art. 3º da Lei que a petição inicial indicará “o dispositivo da lei ou do ato normativo impugnado e os fundamentos jurídicos do pedido em relação a cada uma das impugnações”[86] (destaquei).
Todavia, a discussão sobre o cabimento do controle concentrado de constitucionalidade, pela via abstrata, sobre ato normativo, se pauta em considerar ou não a súmula 105 como espécie de norma com esta qualificação jurídica.
A doutrina não é unânime, tendo posições restritivas quanto ao cabimento do controle de constitucionalidade concentrado sobre ato normativo, seja de tribunal ou da Administração Pública, por exemplo, não importando para essa respeitável corrente qual Poder editou o ato.
Pedro Lenza cita a ADIn 594-DF, tendo posição restritiva ao afirmar que “só podem ser objeto de controle perante o STF lei e atos normativos federais ou estaduais. Súmula de jurisprudência não possui o grau de normatividade qualificada, não podendo, portanto, ser questionada perante o STF através do controle concentrado. E a súmula vinculante pode ser objeto de ADIn? Como se sabe, a EC n. 45/2004 fixou a possibilidade de o STF (e exclusivamente o STF), de ofício ou por provocação, mediante decisão de 2/3 dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal (art. 103-A). O seu § 2º, por seu turno, fixa a possibilidade de, sem prejuízo do que vier a ser estabelecido em lei, proceder-se à aprovação, revisão ou cancelamento de súmula, mediante provocação daqueles que podem propor a ação direta de inconstitucionalidade. Assim, tendo em vista o fato de a súmula não ser marcada pela generalidade e abstração, diferentemente do que acontece com as leis, não se pode aceitar a técnica do ‘controle de constitucionalidade’ de súmula, mesmo no caso da súmula vinculante. O que existe é um procedimento de revisão pelo qual se poderá cancelar a súmula. O cancelamento desta significará a não mais aplicação do entendimento que vigorava. Neste caso, naturalmente, essa nova posição produzirá as suas conseqüências a partir do novo entendimento, vinculando os demais órgãos do Poder Judiciário e a administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal. Finalmente, cabe alertar que o procedimento de aprovação, revisão ou cancelamento de súmula vinculante foi disciplinado pela Lei n. 11.417/2006”[87].
Dirley da Cunha Júnior, especificamente quanto ao cabimento do controle concentrado em face de súmula, citando a mesma ação direta de inconstitucionalidade 594, rel. min. Carlos Velloso (DJ 15/04/94), adota posição intermediária, admitindo-o com relação às súmulas vinculantes: “Consoante entendimento convencional, súmula é a consolidação da jurisprudência predominante de um Tribunal acerca de uma determinada matéria. Segundo o Supremo Tribunal Federal, ‘A súmula, porque não apresenta as características de ato normativo, não está sujeita a jurisdição constitucional concentrada’. Todavia, situação diversa ocorre com a chamada súmula vinculante, criada pela EC 45/04, que inseriu o art. 103-A na Constituição em vigor. Com efeito, em razão da vinculação e obrigatoriedade, ao lado da generalidade e abstração, entendemos que a súmula vinculante pode ser objeto de controle abstrato de constitucionalidade através da ação direta de inconstitucionalidade, por equiparar-se a uma verdadeira lei em sentido material”[88].
Com base em decisões do STF, ainda que discordando delas, Pedro Lenza menciona hipóteses em que é cabível o controle de constitucionalidade pela via concentrada sobre atos normativos de diversas origens: “a) as deliberações administrativas dos órgãos judiciários (precedentes: STF, ADIn 728, rel. Min. Marco Aurélio; b) as deliberações dos Tribunais Regionais do Trabalho judiciários (precedente: STF, ADIn 681/DF, rel. Min. Néri da Silveira), salvo as convenções coletivas de trabalho; c) o STF reconheceu o caráter normativo das resoluções do Conselho Internacional de Preços (STF, Pleno, ADIn 8-0/DF, rel. Min. Carlos Velloso), permitindo, portanto, a sua verificação de compatibilidade com a Constituição Federal”[89].
Ora, me parece contraditório que o STF tenha admitido o controle de constitucionalidade nessas hipóteses sem que admita, ao mesmo tempo, o controle concentrado tendo como objeto súmulas de tribunais, superiores ou não. É de conhecimento geral dos operadores do Direito a circunstância pela qual os tribunais, muitas vezes, decidem determinados julgados exclusivamente com “fundamento” em súmulas “simples”, como se fossem, legitimamente, lei em sentido estrito emanada do Poder Legislativo[90].
Quanto ao controle de constitucionalidade difuso tendo como objeto súmula – especificamente, para nós, a súmula 105 do STJ - não há obstáculos. Há, na doutrina, maior aceitação, ao contrário da hipótese de controle de constitucionalidade concentrado sobre ato normativo, que, em nosso estudo, é a súmula “simples”.
Consoante Pedro Lenza, “O controle difuso, repressivo, ou posterior, é também chamado de controle pela via de exceção ou defesa, ou controle aberto, sendo realizado por qualquer juízo ou tribunal do Poder Judiciário. Quando dizemos qualquer juízo ou tribunal, devem ser observadas, é claro, as regras de competência processual, a serem estudadas no processo civil. O controle difuso verifica-se em um caso concreto, e a declaração de inconstitucionalidade dá-se de forma incidental (incidenter tantum), prejudicialmente ao exame do mérito. Pede-se algo ao juízo, fundamentando-se na inconstitucionalidade de uma lei ou ato normativo, ou seja, a alegação de inconstitucionalidade será a causa de pedir processual.[91]. A explanação do autor demonstra, sem dificuldades, que não há oposição ao controle de constitucionalidade, incidentalmente, contra ato normativo resultante de súmula de tribunal sem o caráter jurídico advindo com a Lei 11.417/06. Exemplo: na época do Presidente Collor, os interessados pediam o desbloqueio dos cruzados fundando-se no argumento de que o ato que motivou tal bloqueio era inconstitucional. O pedido principal não era a declaração de inconstitucionalidade, mas sim o desbloqueio!”
No mesmo sentido, Dirley da Cunha Júnior: “À vista desse modelo, o controle da constitucionalidade dos atos ou omissões do poder público é realizado no curso de uma demanda judicial concreta, e como incidente dela, por qualquer juiz ou tribunal. Daí afirmar-se que o controle difuso é um controle incidental. É uma combinação necessária. Vale dizer, o exame da constitucionalidade da conduta social pode ser agitado, incidenter tantum, por qualquer das partes envolvidas numa controvérsia judicial, perante qualquer órgão do Poder Judiciário, independente de instância ou grau de jurisdição, por meio de uma ação subjetiva (ou peça de defesa) ou de um recurso. Pressupõe a existência de um conflito de interesses, no bojo de uma ação judicial, na qual uma das partes alega a inconstitucionalidade de uma lei ou ato que a outra pretende ver aplicada ao caso. Enfim, desde que se possa deduzir uma pretensão acerca de algum bem da vida ou na defesa de algum interesse subjetivo, pode o interessado argüir, em sede concreta, a inconstitucionalidade como seu fundamento jurídico”[92].
O direito material, de fato, explica o cabimento do controle de constitucionalidade, difuso ou abstrato, segundo defendo, tendo como objeto a súmula 105 do STJ, mediante os termos da Lei 9.868 por seus legitimados ativos, e, também, difusamente pelos demais interessados em qualquer juízo ou tribunal.
Diferenciando atos da Administração de atos administrativos propriamente ditos, o qual nos interessa para nosso estudo, Maria Sylvia Zanella Di Pietro diz que “Dentre os atos da Administração, incluem-se: (...) 6. os atos normativos da Administração, abrangendo decretos, portarias, resoluções, regimentos, de efeitos gerais e abstratos”[93]. A mesma autora ainda afirma: “Além disso, os atos normativos da Administração apresentam vários traços distintivos em relação aos atos individuais, justificando a inclusão em outra categoria: a) o ato normativo não pode ser impugnado, na via judicial, diretamente pela pessoa lesada; apenas pela via de argüição de inconstitucionalidade, cujos sujeitos ativos estão indicados no art. 103 da Constituição, é possível pleitear a invalidação direta do ato normativo”[94].
Para Di Pietro, portanto, o ato normativo[95] pode ser objeto de controle concentrado de constitucionalidade, não, porém, de controle difuso (?!).
Não concordo, entretanto, com a respeitável posição da dileta doutrinadora. Pode o advogado, pelos fundamentos que já foram expostos, discutir a inconstitucionalidade da súmula 105 do Superior Tribunal de Justiça, incidentalmente ao pleito principal, qual seja, o recebimento de seus honorários advocatícios em mandado de segurança se valendo de título executivo extrajudicial pela especialidade da via conferida à classe.
Só não entendo, em termos de razoabilidade, o porquê Di Pietro não admite o controle de constitucionalidade difuso ou incidental em face de ato normativo, de tribunal ou não, ao mesmo tempo em que qualifica o ato como espécie de norma jurídica de efeito geral e abstrato, comparando-o, portanto, ao efeito ou qualidade que a lei em sentido estrito exerce sobre o particular.
Mesmo assim, defendo, com maior razão, até por que defendo inclusive sobre o controle concentrado de constitucionalidade, o controle incidental sobre ato normativo de tribunal, admitindo-o, deste modo, nas hipóteses em que a parte quer ver reconhecido pelo juízo ou tribunal a inconstitucionalidade da súmula 105 do Superior Tribunal de Justiça (posição ampliativa). A parcial eficiência desta espécie de controle é o fato de que mesmo sendo reconhecida a inconstitucionalidade da súmula 105, a decisão judicial surtirá efeitos somente entre as partes do processo, sem efeitos gerais e abstratos, pois é essa a característica principal desta forma de declaração de inconstitucionalidade, de forte inspiração no Direito norte-americano e seus célebres leading cases.
Agora, analisarei a via processual cabível[96] para sanar a inconstitucionalidade da súmula 512 do STF, que segue rito distinto da Lei 9.868 em razão do princípio da especialidade na aplicação da norma nos termos do art. 2º da Lei de Introdução ao Código Civil.
O art. 1º, caput, da Lei 9.882[97], diz que “A argüição prevista no § 1º do art. 102 da Constituição Federal será proposta perante o Supremo Tribunal Federal, e terá por objeto evitar ou reparar lesão a preceito fundamental, resultante de ato do Poder Público”[98].
O inc. I do parágrafo único do art. 1º da Lei 9.882, diz que “Caberá também argüição de descumprimento de preceito fundamental: I - quando for relevante o fundamento da controvérsia constitucional sobre lei ou ato normativo federal, estadual ou municipal, incluídos os anteriores à Constituição”[99] (destaquei), admitindo a argüição de descumprimento incidentalmente ao processo principal[100].
Constata-se que a lei de regência na aferição da constitucionalidade, nas hipóteses em que o direito tido por inconstitucional não se processa mediante os termos da Lei 9.868, pois o objeto em análise fora instituído anteriormente à vigência da Constituição de 1988, recai sobre o chamado “direito pré-constitucional”, processado e julgado pelo Supremo Tribunal Federal nos termos da Lei 9.882, visando tutelar, pois, “preceito fundamental”[101].
É a explicação dada pelo ministro Gilmar Mendes: “Nos termos da Lei n. 9.882/99, cabe a argüição de descumprimento de preceito fundamental para evitar ou reparar lesão a preceito fundamental, resultante de ato do Poder Público (art. 1º, caput). O parágrafo único do art. 1º explicita que caberá também a argüição de descumprimento quando for relevante o fundamento da controvérsia constitucional sobre lei ou ato normativo federal, estadual ou municipal, inclusive anteriores à Constituição (leis pré-constitucionais). Assim, a argüição de descumprimento poderá ser utilizada para solver controvérsias constitucionais sobre a constitucionalidade do direito federal, do direito estadual e também do direito municipal. Diferentemente do que ocorre com o controle abstrato de normas, a ADPF poderá ter por objeto direito revogado, desde que subsista interesse jurídico no pronunciamento judicial. Vê-se, pois, que a argüição de descumprimento vem completar o sistema de controle de constitucionalidade de perfil relativamente concentrado no STF, uma vez que as questões até então não apreciadas no âmbito do controle abstrato de constitucionalidade (ação direta de inconstitucionalidade e ação declaratória de constitucionalidade) poderão ser objeto de exame no âmbito da nova ação”[102].
Gilmar Mendes tenta traduzir o significado de “preceito fundamental” mencionado pelo caput e pelo inc. I do parágrafo único do art. 1º da Lei 9.882, reconhecendo que “É muito difícil indicar, a priori, os preceitos fundamentais da Constituição passíveis de lesão tão grave que justifique o processo e julgamento da argüição de descumprimento. Não há dúvida de que alguns desses preceitos estão enunciados, de forma explícita, no texto constitucional. Assim, ninguém poderá negar qualidade de preceitos fundamentais da ordem constitucional aos direitos e garantias individuais (art. 5º, dentre outros). Da mesma forma, não se poderá deixar de atribuir essa qualificação aos demais princípios protegidos pela cláusula pétrea do art. 60, § 4º, da CF: o princípio federativo, a separação de poderes, o voto direto, secreto, universal e periódico”[103].
Analisando a TEORIA DA RECEPÇÃO, conceito que tem de ser entendido concomitantemente ao significado do que vem a ser “preceito fundamental”, no momento, justamente, em que se aborda a inconstitucionalidade da súmula 512 do STF e o exercício processual respectivo, previsto pela Lei da ADPF, André Ramos Tavares diz que “O surgimento de novas Constituições faz iniciar-se, consoante a teoria constitucional, um novo ordenamento jurídico. O conjunto das normas pretéritas existentes no Estado é simplesmente superado para dar lugar a uma nova realidade normativa, a partir do documento supremo, que é a Constituição. A realização de um novo sistema de normas jurídicas a partir da manifestação originária do poder constituinte provoca a necessidade imediata de conceber novas regulamentações jurídicas, por meio das fontes e instrumentos previstos pela Constituição para tanto. A renovação, pois, surge como necessidade premente com o aparecimento de uma nova Constituição”[104].
Neste momento já se pode tirar algumas conclusões sobre a ADPF no tocante à súmula 512 do STF, ou seja, a admissibilidade na aferição da (in)constitucionalidade ou “não-receptividade” em virtude do ato político por excelência que foi a edição da Constituição de 1988, posterior ao ato normativo representado pela súmula em análise do Supremo Tribunal: i) trata-se de ato normativo emanado de tribunal; ii) sendo considerado, para os efeitos da Lei 9.882, “direito pré-constitucional”; iii) pode ser processada e julgada pelo Supremo Tribunal Federal nos termos da Lei 9.882, tanto pela via abstrata ou concentrada, como pela via difusa ou incidental.
A doutrina, entretanto, está longe da unanimidade.
Contrário à possibilidade do controle difuso em ADPF, aplicando-se a restrição ao nosso estudo, sobre a inconstitucionalidade da súmula 512 e a possibilidade de aferição deste ato normativo mediante a Lei 9.882 por seus legitimados ativos (v. art. 2º da LADPF), Pedro Lenza: “A Constituição somente autorizou a apreciação, pelo STF, da argüição de preceito fundamental, na forma da lei. Já havia previsto competência ao STF, em sede de ADIn, para apreciação de lei ou ato normativo federal ou estadual, como já visto, excluídos os municipais e anteriores à Constituição. Portanto, ao que se percebe, a lei utilizou-se de manobra para levar ao STF matéria que o constituinte originário não estabeleceu. Entendemos, então, que deveria haver alteração, por emenda, ao art. 102, I, ‘a’, da CF, para se permitir a chamada argüição por equiparação. Não se discute a sua utilidade, mas entendemos que deveria haver uma correção do texto, sob pena de o legislador infraconstitucional estar atribuindo competência ao STF, não prevista na CF/88”[105].
Pelo posicionamento de Pedro Lenza, já se pode tirar que ele inadmite a aplicação da ADPF, precisamente nos termos do inc. I do parágrafo único do art. 1º da Lei 9.882, porque vê inconstitucionalidade na chamada argüição de descumprimento de preceito fundamental “por equiparação”, não podendo haver utilização de norma processual inconstitucional – segundo o autor – como instrumento de aferição de inconstitucionalidade incidental de determinado ato normativo, no caso a súmula 512 do Supremo Tribunal Federal, aplicando-se mutatis mutandis, o douto posicionamento ao nosso estudo sem que haja, entretanto, concordância com seu conteúdo. Trata-se, em suma, de posição restritiva: nega admissibilidade de ADPF incidental para discutir a inconstitucionalidade da citada súmula 512. Realmente, e em coerência com a visão de mundo do autor, não é possível discutir a inconstitucionalidade de ato normativo – da súmula 512 – se utilizando o intérprete de norma instrumental reputada inconstitucional. Seria o mesmo, guardadas as devidas proporções, de haver a possibilidade jurídica de condenação em pena privativa da liberdade sob o fundamento exclusivo em determinada prova ilícita reconhecida pelo próprio juízo...
Contrário, igualmente, à admissibilidade da argüição de descumprimento de preceito fundamental “por equiparação”, Alexandre de Moraes: “Essa hipótese de argüição de descumprimento de preceito fundamental, prevista no parágrafo único do art. 1º, da Lei nº 9.882/99, distanciou-se do texto constitucional, uma vez que o legislador ordinário, por equiparação legal, também considerou como descumprimento de preceito fundamental qualquer controvérsia constitucional relevante sobre lei ou ato normativo federal, estadual ou municipal, incluídos os anteriores à Constituição. O texto constitucional é muito claro quando autoriza à lei o estabelecimento, exclusivamente da forma pela qual o descumprimento de um preceito fundamental poderá ser argüido perante o Supremo Tribunal Federal. Não há qualquer autorização constitucional para uma ampliação das competências do STF. Controvérsias entre leis ou atos normativos e normas constitucionais, relevantes que sejam, não são hipóteses idênticas ao descumprimento pelo Poder Público de um preceito fundamental, e devem ser resolvidas em sede de controle de constitucionalidade, tanto difuso quanto concentrado. O legislador ordinário utilizou-se de manobra para ampliar, irregularmente, as competências constitucionais do Supremo Tribunal Federal, que conforme jurisprudência e doutrina pacíficas, somente podem ser fixadas pelo texto magno. Manobra essa eivada de flagrante inconstitucionalidade, pois deveria ser precedida de emenda à Constituição”[106].
Trata-se de posição também restritiva, não admitindo, portanto, a utilização da ADPF “por equiparação” ou incidental à aferição de inconstitucionalidade ou “não-receptividade” de ato normativo de tribunal, qual seja, a súmula 512 em tela. Para o constitucionalista, porém, a utilização da via concentrada da ADPF, em cotejo com o nosso estudo, seria admissível desde que respeitados os requisitos de admissibilidade previstos na Lei 9.882/99.
Pedro Lenza ainda traz ponderações do ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes: “Nesse sentido, de acordo com Gilmar Ferreira Mendes, surge instrumento adequado ao combate da chamada ‘guerra de liminares’, introduzindo profundas alterações no sistema brasileiro de controle de constitucionalidade: ‘Em primeiro lugar, porque permite a antecipação de decisões sobre controvérsias constitucionais relevantes, evitando que elas venham a ter um desfecho definitivo após longos anos, quando muitas situações já se consolidaram ao arrepio da ‘interpretação autêntica’ do Supremo Tribunal Federal’. ‘Em segundo lugar, porque poderá ser utilizado para – de forma definitiva e com eficácia geral – solver controvérsia relevante sobre a legitimidade do direito ordinário pré-constitucional em face da nova Constituição que, até o momento, somente poderia ser veiculada mediante utilização do recurso extraordinário’. ‘Em terceiro, porque as decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal nesses processos, haja vista a eficácia erga omnes e o efeito vinculante, fornecerão a diretriz segura para o juízo sobre a legitimidade ou a ilegitimidade de atos de teor idêntico, editados pelas diversas entidades municipais. A solução oferecida pela nova lei é superior a uma outra alternativa oferecida, que consistiria no reconhecimento da competência dos Tribunais de Justiça para apreciar, em ação direta de inconstitucionalidade, a legitimidade de leis ou atos normativos municipais em face da Constituição Federal. Além de ensejar múltiplas e variadas interpretações, essa solução acabaria por agravar a crise do Supremo Tribunal Federal, com a multiplicação de recursos extraordinários interpostos contra as decisões proferidas pelas diferentes Cortes estaduais’ (Gilmar Ferreira Mendes, Revista Jurídica Virtual, n. 7, dez./1999)”[107].
As ponderações do ministro, pelo que se nota, são comprazes ao entendimento que ele vem defendendo no sentido de que cabe ao Supremo Tribunal Federal, mediante controle concentrado ou abstrato, afastar, gradativamente, a via difusa ainda existente em nosso modelo de controle de constitucionalidade, que é parcialmente concentrado. Tal posicionamento pode significar restrição à utilização da ADPF “por equiparação” ou incidental na apuração da inconstitucionalidade ou “não-receptividade” de ato normativo emanado pelo STF através da súmula 512. De qualquer forma, “não posso falar pelo ministro”, não se sabendo, à primeira vista, qual seria, especificamente, o posicionamento de Gilmar Mendes em se tratando desta súmula e o meio processual cabível, ou melhor, se cabível.
Em sentido contrário, admitindo a via incidental da ADPF à aferição de inconstitucionalidade ou “não-receptividade” de ato normativo (de tribunal), André Ramos Tavares: “A argüição de descumprimento de preceito constitucional fundamental é uma garantia de origem constitucional, de natureza processual, que visa preservar a obediência geral devida às regras e princípios constitucionais que, considerados fundamentais, estavam, de há muito, dentro de um quadro evolutivo, a demandar mecanismo próprio de proteção quanto a determinados preceitos (os de cunho fundamental) significa, sem dúvida, que ‘se supervalorizam, por via de sua máxima proteção, determinados preceitos’ [o autor cita Raúl Canosa Usera, Interpretación Constitucional y Fórmula Política, p. 166, t.a.]. Essa idéia de que há um conjunto de preceitos que merecem proteção mais intensa que os demais preceitos integrantes da Constituição não é inovadora. Como instituto criado a partir da Constituição, é preciso conferir-lhe sua matiz com observância das regras próprias da hermenêutica constitucional. Sublinhe-se, nesse sentido, que só cabe a argüição quando há descumprimento de preceito fundamental”[108]. Nominando como “argüição de surgimento incidental ou por derivação”, o autor, depois de falar da importância constitucional do instituto, se posiciona, enfim, nestes termos: “Estabelece o parágrafo único do art. 1º da L.A.: ‘Caberá também a argüição de descumprimento de preceito fundamental: I – quando for relevante o fundamento da controvérsia constitucional sobre lei ou ato normativo federal, estadual ou municipal, incluídos os anteriores à Constituição’. Ora, após no caput ter a lei tratado da argüição como ação judicial, a ser proposta pelos legitimados do art. 103 da Constituição (art. 2º, I, da Lei da Argüição), passa a tratar de outra modalidade de argüição, declarando que também é esta cabível como incidente em processo já em curso [o autor cita Juliano Taveira Bernardes, Uadi Lâmmego Bulos, Walter Claudius Rothenburg, Zeno Veloso e Sérgio Rezende de Barros como adeptos da via incidental, em nota de rodapé]. E isso é assim por diversos motivos, que se passa a expor. Em primeiro lugar, há uma argüição incidental, ao lado daquela exercida por ação, porque a controvérsia com ‘relevante fundamento’ à qual faz menção o inciso I do parágrafo único do art. 1º só pode ser aquela que se apresenta em juízo, e não qualquer controvérsia que se instale entre particulares, não levada necessariamente ao conhecimento da Justiça, ou ainda uma controvérsia doutrinária. Confirma esse entendimento o disposto no art. 3º, quando exige que a petição inicial contenha, ‘V – se for o caso, a comprovação da existência de controvérsia judicial relevante sobre a aplicação do preceito fundamental que se considera violado’. Ora, será o caso de exigir mencionada comprovação se se tratar da argüição incidental. Este o alcance exato do dispositivo [o autor cita, como complemento, os § § 2º e 3º do art. 5º da L.A., em nota de rodapé]. O ponto central de sustentação da tese, contudo, tem alcance constitucional. É que não poderia haver a criação de uma ‘argüição de descumprimento de preceito fundamental’ quando houvesse não o descumprimento de um preceito fundamental, como quer a Constituição, mas sim simples relevância do fundamento de controvérsia instaurada, à margem de qualquer referência a preceito fundamental. Isso equivaleria a criar uma ação absolutamente nova, de competência originária do Supremo Tribunal, sob o manto da argüição. Essa interpretação, que realmente deve ser de pronto afastada, parece reavivar a já repudiada avocatória, e levaria à consideração positiva acerca da inconstitucionalidade do preceito em análise [o autor cita em nota de rodapé Alexandre de Moraes e Uadi Lâmmego Bulos, criticando a posição de ambos no sentido de que existem três hipóteses de cabimento da argüição, entre as quais estaria incluída a hipótese de quando for relevante o fundamento da controvérsia constitucional sobre lei ou ato normativo federal, estadual ou municipal, incluídos os anteriores à Constituição]. Se se pretende, realmente, preservar o incidente de inconstitucionalidade a que faz referência o dispositivo, tem-se de interpretá-lo em consonância com a Lei Maior. Assim, a medida que se apresenta no inciso I do parágrafo único do art. 1º da Lei da Argüição deve ser considerada como a segunda espécie de argüição, ao lado da primeira, que é sua modalidade por via de ação direta, presente no caput do mesmo dispositivo. Trata-se, pois, do incidente de descumprimento de preceito fundamental, que também se poderia designar como argüição por derivação. Ao contrário da ação, a argüição incidental tem campo mais restrito, como se verá, já que, além de exigir o descumprimento de preceito fundamental, como não poderia deixar de ser, acresce outra condição: a relevância da questão e, ainda, que o descumprimento origine-se de ato normativo (e não de qualquer ato do Poder Público, como ocorre na modalidade direta)”[109].
André Ramos Tavares, portanto, admite a via incidental da ADPF, admitindo sua admissibilidade em face de ato normativo não-recepcionado pela nova ordem constitucional, interessando, para o nosso estudo, a súmula 512 do STF, segundo o Direito Administrativo expressado pela doutrina.
Defendendo também a admissibilidade da ADPF incidental ou “por equiparação”, Dirley da Cunha Júnior: “A Lei nº 9.882/99, ao regular o § 1º do art. 102 da Constituição Federal, fixou dois ritos distintos para a argüição de descumprimento de preceito fundamental. Estabeleceu, assim, (a) um processo de natureza objetiva, no qual a argüição é proposta diretamente no Supremo Tribunal Federal, independentemente da existência de qualquer controvérsia, para a defesa exclusivamente objetiva dos preceitos fundamentais ameaçados ou lesados por qualquer ato do poder público e (b) um processo de natureza subjetivo-objetiva, no qual a argüição é proposta diretamente no Supremo Tribunal Federal, em razão de uma controvérsia constitucional relevante, em discussão perante qualquer juízo ou tribunal, sobre a aplicação de lei ou ato do poder público questionado em face de algum preceito fundamental. Tal distinção meramente processual vem sendo considerada pela doutrina como modalidades de argüição de descumprimento de preceito fundamental, previstas, respectivamente, no caput do art. 1º e no inciso I do parágrafo único do mesmo art. 1º, da referida Lei. A divulgação de tipologias de argüições não é apropriada, pois pode infundir uma falsa idéia de que a Lei instituiu mais uma modalidade de argüição, para além daquela constitucionalmente consagrada. Na verdade, a Lei não criou modalidade nova de argüição, nem poderia fazê-lo sob pena de incidir em manifesta inconstitucionalidade, mas tão-somente contemplou processamentos diversos à ação constitucional de argüição originada da Constituição. É preciso, portanto, fixar a premissa de que somente em razão da distinção de ritos é que se pode falar em modalidades de argüição, para abranger a argüição direta ou autônoma e a argüição incidental, sujeitas a pressupostos processuais distintos, embora destinadas à defesa dos preceitos fundamentais. Assim, dispondo sobre a argüição direta ou autônoma, diz o art. 1º, caput, da Lei 9.882/99 que ‘A argüição prevista no § 1º do art. 102 da Constituição Federal será proposta perante o Supremo Tribunal Federal, e terá por objeto evitar ou reparar lesão a preceito fundamental, resultante de ato do Poder Público’. Já tratando da argüição incidental, prescreve o mesmo art. 1º, porém no parágrafo único, inciso I, que caberá também argüição de descumprimento de preceito fundamental quando for relevante o fundamento da controvérsia constitucional sobre lei ou ato normativo do poder público. Distinguem-se fundamentalmente essas duas modalidades de argüição. A argüição autônoma é uma típica ação direta de controle concentrado-principal de constitucionalidade, proposta perante o Supremo Tribunal Federal e destinada à defesa objetiva dos preceitos constitucionais fundamentais ameaçados ou lesados por ato do poder público. Já a argüição incidental é uma ação de controle concentrado-incidental suscitada perante o Supremo Tribunal Federal, em razão de um processo judicial em curso perante as instâncias onde se controverte, com fundamentos relevantes, acerca da aplicação de ato do poder público questionado em face de algum preceito constitucional fundamental, tendo por finalidade predominante a defesa de um interesse ou direito subjetivo de uma das partes. Desse modo, enquanto a argüição autônoma independe de qualquer controvérsia, a argüição incidental é dependente da existência de controvérsia relevante em curso perante qualquer juízo ou tribunal. Aquela é autônoma exatamente por não depender de qualquer controvérsia, aproximando-se, nesse particular, da ação direta de inconstitucionalidade; esta é incidental por surgir em razão mesma de uma controvérsia, isto é, por nascer como incidente no seio de um processo judicial concreto, em face de uma controvérsia constitucional relevante. A argüição incidental se aproxima muito do Verfassungsbeschwerde do direito alemão e do recurso de amparo do direito espanhol, dos quais já se falou, embora tenha uma destinação mais ampla, pois visa à defesa de qualquer preceito fundamental, contemple ele um direito fundamental ou não. Seu principal objetivo é possibilitar uma decisão antecipada do Supremo Tribunal Federal sobre as questões constitucionais relevantes discutidas em processos concretos, que só chegariam a seu conhecimento, muito tempo depois, através do recurso extraordinário. Nesse sentido, interessa observar as ponderações de um dos idealizadores da Lei que fixou o processo da argüição[110]: ‘Com isso, permite-se antecipar o deslinde de uma questão jurídica que percorreria a via crucis do sistema difuso até chegar ao Supremo Tribunal Federal, para então, após decisão definitiva, ser comunicado o Senado Federal, que poderá suspender a eficácia da lei impugnada, podendo sanar definitivamente a inconstitucionalidade. Porém, a novel ação serve somente aos preceitos fundamentais, e nesse caso não se admite controvérsia ou demora. Há que se decidir univocamente sobre o tema magno, sob pena de ser atropelada a segurança jurídica e o Estado de Direito, que ficam seriamente prejudicados diante do dissenso acerca dos seus pilares de sustentação, que são os preceitos fundamentais da Lei Maior’. (grifado no original).”[111].
Acompanho, pelos próprios e jurídicos fundamentos, André Ramos Tavares e Dirley da Cunha Júnior, admitindo a via incidental da ADPF para tisnar de inconstitucional ou “não-recepcionada” a súmula 512 do Supremo Tribunal Federal depois de demonstrado se tratar de ato normativo, não só atacável pela via concentrada nos termos da Lei 9.882, mas, também, pela via difusa ou incidental em cada juízo ou tribunal nos casos concretos (posição ampliativa).
Interessante, a propósito, fazer o paralelo com o posicionamento de Pedro Lenza ao não admitir a admissibilidade do controle de constitucionalidade pela via da ADPF incidental, com o art. 543-C, do CPC[112]: tal como ocorreu com a argüição incidental, prevista no inc. I do parágrafo único do art. 1º da Lei 9.882, o art. 543-C não decorreu, ao prever a nova “repercussão geral infraconstitucional” - processada e julgada pelo STJ em nítido controle de legalidade da norma infraconstitucional -, de expresso texto constitucional[113], ainda que derivado[114]. Essa circunstância, ou seja, a ausência de texto constitucional prévio como suporte autorizador à regulamentação de matéria constitucional pela lei infraconstitucional, diferentemente do que ocorreu com o caput do art. 1º da Lei 9.882, segundo Pedro Lenza, faz com que o instituto da APDF incidental seja inconstitucional? Poderia ser o mesmo entendimento do constitucionalista se abordasse – ou quando abordar - o art. 543-C[115], cit., sob o aforismo ubi eadem ratio, ibi eadem ius?[116]. A resposta só pode ser afirmativa pelo que vem sendo defendido pelo autor, que, quer queira ou não, é coerente em suas posições.
Que a advocacia privada faça um levante contra as súmulas 512 do Supremo Tribunal Federal e 105 do Superior Tribunal de Justiça no fito de derrubar as inconstitucionalidades dos enunciados que fissuram, atualmente, o direito constitucional aos honorários advocatícios em face do princípio da causalidade em mandado de segurança.
O coro dos advogados, em cada foro deste País, é motivo suficiente para legitimar a força e a insurgência destes profissionais no sentido de lutar sob o devido processo legal pela verba alimentar devida, lembrando, por pertinência, tratar-se da classe responsável por fomentar os maiores debates jurídicos da história talvez pela independência de seus membros, que não se submetem à hierarquia própria do regime jurídico administrativo das instituições públicas.
Na briga pela aplicação do princípio que pugna pela verba honorária, sem o abandono da legalidade perseguida pelos advogados, significativo, com efeito, o conteúdo dado por Paulo Bonavides aos princípios constitucionais no ordenamento jurídico vigente: “Fazem eles a congruência, o equilíbrio e a essencialidade de um sistema jurídico legítimo. Postos no ápice da pirâmide normativa, elevam-se, portanto, ao grau de normas das normas, de fonte das fontes. São qualitativamente a viga-mestra do sistema, o esteio da legitimidade constitucional, o penhor da constitucionalidade das regras de uma Constituição”[117].
José Afonso da Silva, citando a doutrina lusa, diz que “Os princípios são ordenações que se irradiam e imantam os sistemas de normas, são [como observam Gomes Canotilho e Vital Moreira] ‘núcleos de condensações’ nos quais confluem valores e bens constitucionais. Mas, como disseram os mesmos autores, ‘os princípios, que começam por ser a base de normas jurídicas, podem estar positivamente incorporados, transformando-se em normas-princípio e constituindo preceitos básicos da organização constitucional’”[118].
Celso Antônio Bandeira de Mello, admitindo o raio de profundidade que os princípios exercem sobre o ordenamento jurídico, afirma que princípio “é, por definição, mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico. É o conhecimento dos princípios que preside a intelecção das diferentes partes componentes do todo unitário que há por nome sistema jurídico positivo. Violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma qualquer. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio atingido, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra. Isto porque, com ofendê-lo, abatem-se as vigas que o sustêm e alui-se toda a estrutura nelas esforçada”[119].
Carlos Ayres Britto, em comentários à peculiar estrutura conceitual dos princípios constitucionais, ensina, sempre com estilo: “É que certos princípios (dignidade da pessoa humana, valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, moralidade, eficiência...) se traduzem numa materialidade ou estrutura conceitual que em parte é atual e em parte é prospectiva. A parte atual é de pronto formada com os dados-de-compreensão que afloram da própria tecnicalidade constitucional, sem necessidade de o intérprete recorrer a elementos de compreensão que se situem no plano do sistema social genérico (sistema político, econômico, militar, moral, religioso, familiar, etc.). A parte futura é aquela que vai buscar o seu conceito no modo como o povo passa a sentir e praticar o discurso normativo-constitucional ao longo do tempo. Logo, é uma parte vocacionada para a mutabilidade, enquanto a outra, para a imutabilidade”[120]. E prossegue o constitucionalista: “Há como que uma dialeticidade no próprio interior de certos princípios, no âmbito de sua própria circunferência semântica, fazendo com que a Lei das Leis ganhe essa possibilidade de se ajustar mais facilmente à irrupção de fatos novos ou a novas valorações de fatos velhos. A tensão entre permanecer incólume e experimentar alterações ocorre no imo, no recôndito de cada princípio mesmo e o atrito se resolve por uma solução endógena de compromisso que leva a Constituição a mudar para permanecer idêntica a si mesma (na medida em que a mutabilidade na periferia do princípio se faz é para robustecer, ou assegurar, a operatividade da parte nuclear desse princípio mesmo)”[121].
Luís Roberto Barroso, ao estudar os princípios em sua interpretação especificamente constitucional, diz que “O ponto de partida do intérprete há que ser sempre os princípios constitucionais, que são o conjunto de normas que espelham a ideologia da Constituição, seus postulados básicos e seus fins. Dito de forma sumária, os princípios constitucionais são as normas eleitas pelo constituinte como fundamentos ou qualificações essenciais da ordem jurídica que institui. A atividade de interpretação da Constituição deve começar pela identificação do princípio maior que rege o tema a ser apreciado, descendo do mais genérico ao mais específico, até chegar à formulação da regra concreta que vai reger a espécie”[122], prosseguindo com a ideologia peremptória do instituto ao afirmar: “Pois os princípios constitucionais são, precisamente, a síntese dos valores mais relevantes da ordem jurídica. A Constituição, como já vimos, é um sistema de normas jurídicas. Ela não é um simples agrupamento de preceitos que se justapõem ou que se superpõem. A idéia de sistema funda-se na de harmonia, de partes que convivem sem atritos. Em toda ordem jurídica existem valores superiores e diretrizes fundamentais que ‘costuram’ suas diferentes partes. Os princípios constitucionais consubstanciam as premissas básicas de uma dada ordem jurídica, irradiando-se por todo o sistema. Eles indicam o ponto de partida e os caminhos a serem percorridos”[123].
Creio ter nesta altura demonstrado o significado nefasto ao ordenamento jurídico quando violado um princípio. Nem se diga quando tal violação tem como embrião a defesa dos cofres públicos[124] através das súmulas 512 do Supremo Tribunal Federal e 105 do Superior Tribunal de Justiça.
Em parelho com o que venho defendendo[125], ou seja, sobre a necessidade do reconhecimento dos honorários advocatícios, quer na fase executiva do procedimento, quer nas ações constitucionais em mandado de segurança, decidiu o Superior Tribunal de Justiça: “Processo civil – Cumprimento de sentença – Nova sistemática imposta pela Lei nº 11.232/2005. Condenação em honorários. Possibilidade. O fato de se ter alterado a natureza da execução de sentença, que deixou de ser tratada como processo autônomo e passou a ser mera fase complementar do mesmo processo em que o provimento é assegurado, não traz nenhuma modificação no que tange aos honorários advocatícios. A própria interpretação literal do art. 20, § 4º, do CPC não deixa margem para dúvidas. Consoante expressa dicção do referido dispositivo legal, os honorários são devidos ‘nas execuções, embargadas ou não’. O art. 475-I do CPC é expresso em afirmar que o cumprimento da sentença, nos casos de obrigação pecuniária, se faz por execução. Ora, se haverá arbitramento de honorários na execução (art. 20, § 4º, do CPC) e se o cumprimento da sentença se faz por execução (art. 475, I, do CPC), outra conclusão não é possível, senão a de que haverá a fixação de verba honorária na fase de cumprimento da sentença. Ademais, a verba honorária fixada na fase de cognição leva em consideração apenas o trabalho realizado pelo Advogado até então. Por derradeiro, também na fase de cumprimento de sentença, há de se considerar o próprio espírito condutor das alterações pretendidas com a Lei nº 11.232/2005, em especial a multa de 10% prevista no art. 475-J do CPC. De nada adiantaria a criação de uma multa de 10% sobre o valor da condenação para o devedor que não cumpre voluntariamente a sentença se, de outro lado, fosse eliminada a fixação de verba honorária, arbitrada no percentual de 10% a 20%, também sobre o valor da condenação. Recurso Especial conhecido e provido”[126].
Sobre a multa do art. 475-J do CPC, vide meu ensaio “O DIES A QUO NA MULTA DO ART. 475-J, CAPUT, DO CPC”[127].
No ensaio “RELENDO PRINCÍPIOS E RENUNCIANDO A DOGMAS”, onde seus fundamentos podem, sem censura, servir de parâmetro ao que venho defendendo a respeito das inconstitucionalidades das súmulas 512 e 105, engessadas pela jurisprudência dominante, profícuo o pensamento de Cândido Rangel Dinamarco: “Com esse espírito, há muito as técnicas processuais vêm mitigando o rigor dos princípios em certos casos, para harmonizá-los com os objetivos superiores a realizar (acesso à justiça) e vão também, com isso, renunciando a certos dogmas cujo culto obstinado seria fator de injustiças no processo e em seus resultados. Exemplo vivo dessa postura são as medidas cautelares ou antecipatórias concedidas inaudita altera parte, que trazem em si alguma transgressão à garantia constitucional do contraditório, justamente porque não são precedidas de qualquer manifestação do demandado; mas ninguém ousa repudiar essas medidas urgentes, sabedores que somos de que elas são o instrumento adequado e apto a oferecer uma tutela jurisdicional que, se ficar para depois, poderá tornar-se impossível, menos útil ou mesmo desprovida de qualquer utilidade. O mesmo se vê nas execuções por título extrajudicial, que impõem desde logo uma constrição sobre o patrimônio do executado, para só depois lhe dar oportunidade de se manifestar, opondo embargos”[128].
Essa renúncia aos dogmas mencionada por Dinamarco[129] pode e deve nortear a posição jurisprudencial que repele o recolhimento dos honorários advocatícios em mandado de segurança com fundamento exclusivo nas súmulas 512 e 105. Sem dúvida, decisão judicial denegatória da verba honorária nestas ações e cujo exclusivo fundamento sejam as citadas súmulas, é um bom exemplo de nulidade[130] na leitura feita pelo direito público[131].
Lutem advogados, dentro da legalidade, pelo reconhecimento do princípio da causalidade em mandado de segurança, em prol, antes de tudo, da ordem jurídica justa, explicação encontrada por Tercio Sampaio Ferraz Jr. ao afirmar no pórtico de sua monografia “em parte por que obedecemos, por que mandamos, por que nos indignamos, por que aspiramos a mudar em nome de ideais”[132], motivo suficiente para que se interprete o art. 5º, inc. LXXVII, da Constituição Federal, quanto à gratuidade e os atos necessários ao exercício da cidadania, sem exclusão da garantia fundamental aos honorários advocatícios negados atualmente pela jurisprudência dominante dos colendos tribunais superiores na aplicação das inconstitucionais súmulas 512 do STF e 105 do STJ.
Dentre as respeitáveis posições em sentido contrário, tenho como mais acertada a posição de NELSON NERY JR., defendendo o recolhimento dos honorários advocatícios apenas se concedida a ordem, ou seja, secundum eventum litis, pois seu exercício, justifica o jurista, deve ser facilitado[133] pelo poder público.
No grilhão desta exposição, concluo em apertada síntese que foi defendida a necessidade do reconhecimento do princípio da causalidade em mandado de segurança diante da inconstitucionalidade material das súmulas 512 do STF e 105 do STJ, aplicadas reiteradamente pela jurisprudência dominante ainda que sem o conteúdo jurídico dos efeitos vinculantes das súmulas do Supremo Tribunal Federal depois da Lei 11.417/06, havendo a possibilidade - a contrario sensu – segundo o inc. XXXV do art. 5º da Constituição Federal, em se afastar as inconstitucionalidades das citadas súmulas, exemplos de ato normativo editados por tribunal com reflexos jurisdicionais pelo não recolhimento dos honorários advocatícios, incorporando características que ultrapassam meros atos de administração, podendo ser objeto de controle concentrado de constitucionalidade[134] na redação das Leis 9.868/99 no caso da súmula 105 do STJ e 9.882/99 no caso da súmula 512 do STF, ambas julgas pelo Pretório Excelso, sem prejuízo, igualmente, da via incidental[135] julgada pelo juiz ou tribunal, desde que respeitadas, evidentemente, as regras ordinárias de competência ex vi do livre convencimento motivado aberto pelo art. 131 do Código de Processo Civil.
Sendo julgado pelo Supremo Tribunal Federal, em virtude de sua missão de guardião precípuo da Constituição, detentor de competência jurisdicional absoluta no controle concentrado de constitucionalidade, mediante ação direta de inconstitucionalidade ou argüição de descumprimento de preceito fundamental, espécies de controle possíveis na declaração de inconstitucionalidade em sentido lato das respectivas súmulas conforme a exposição, que adota a posição ampliativa sobre o tema, os advogados pleiteiam uma atitude concreta do Conselho Federal[136] da Ordem dos Advogados do Brasil[137] para que tome as providências processuais cabíveis sem represálias políticas[138] de qualquer espécie.
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[1] DI PIETRO, 2006, p. 731.
[2] Muitos doutrinadores se referem a “verbetes” ou “enunciados”, alegando que o termo “súmula” se refere ao número que foi registrada pelo tribunal, o que não altera, em substância, absolutamente nada, refletindo tão somente o modo de ser ou o estilo de cada intérprete quando se refere ao instituto. Empregarei o termo “súmula”, súmula 512, súmula 105, na certeza de que estou trocando “seis por meia-dúzia”, mantido o conteúdo dos atos normativos emanados de tribunal, sendo indiferente o rótulo empregado pela turma “dos seis” ou da turma “meia-dúzia”, ambos pertencentes à mesma “turma”.
[3] Essa é a jurisprudência dominante nos tribunais inferiores e superiores.
[4] O direito intertemporal – mas não só ele - servirá para embasar, dentro da Teoria da Constitucionalidade, os meios processuais cabíveis em face de cada súmula vigente, como, por exemplo, as súmulas 512 e 105 do STF e STJ, respectivamente. Tudo o que foi editado, inclusive os atos normativos de tribunal anteriores à Constituição de 1988, passa pelo crivo da “recepção”. Depois da promulgação da Constituição, fala-se em “inconstitucionalidade”, sem que o conteúdo de cada ato normativo se diferencie, entre si, refletindo, tão somente, a adequação do procedimento a ser adotado para evitar multiplicidade absurda de eventuais ações diretas de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal, tornando-se inviável o julgamento de todas as alegadas “inconstitucionalidades” se fossem processadas uniformemente, um dos motivos encontrados pelo instituto da Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental, previsto na Lei 9.882, de 3 de dezembro de 1999, de caráter subsidiário e bem menos utilizado pelos operadores para diminuir a discussão quanto à validade das normas infraconstitucionais pertencentes ao direito pré-constitucional em face da Constituição vigente. O fato é que a ADPF não é tão utilizada se comparada com as ações diretas de inconstitucionalidade, as ações declaratórias de constitucionalidade etc., podendo ser bem mais exploradas doravante.
[5] Ocasião em que discutirei qual o controle repressivo de constitucionalidade incidente na espécie, ou seja, o difuso ou o concentrado, ou se é possível, ainda, a dupla admissão da via processual útil e adequada na discussão das inconstitucionalidades das súmulas 512 e 105 citadas.
[6] Súmula 512 do STF: “não cabe condenação em honorários de advogado na ação de mandado de segurança”.
[7] Súmula 105 do STJ: “na ação de mandado de segurança não se admite condenação em honorários advocatícios”.
[8] LENZA, 2008, p. 648.
[9] THEODORO JÚNIOR, 2003, p. 88.
[10] DINAMARCO, 2004, p. 653.
[11] DINAMARCO, Revista Jus Vigilantibus. Disponível em: <http://jusvi.com/artigos/27456>. Acesso em: 25 de jun. 2008.
[12] STF, 2ª T., - RExtr. n.º 166.206/RN - Rel. Min. Nelson Jobim.
[13] STF, 1ª T., RExtr. n.º 106.482/RS - Rel. Min. Sydney Sanches, Diário da Justiça, Seção I, 10 jun. 1998, p. 14.404.
[14] STF, 1ª T., RExtr. n.º 106.482/RS - Rel. Min. Sydney Sanches, Diário da Justiça, Seção I, 10 jun. 1998, p. 14.404.
[15] STJ, Embargos de Divergência no REsp 27.879-4-RJ - Rel. Min. Nilson Naves, DJU 8.11.1993, p. 23494.
[16] BEDAQUE, 2004, pp. 108/109.
[17] 1º TACSP, 4ª Câmara, Ap. 504.371-0, Praia Grande, j. 18.5.1994, votação unânime.
[18] BEDAQUE, 2007 e 2006.
[19] BEDAQUE, 2004, pp. 108/109.
[20] STJ, REsp 15.468-0-RS, 1ª Turma - Rel. Min. Cesar Rocha, DJU 12.4.1993, p. 6053.
[21] STJ, REsp 19.096-0-RJ, 1ª Turma - Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, j. 7.6.1993.
[22] Princípio que ultrapassa a conotação jurídica, pois utilizado na Física, na Química, na Biologia e em quaisquer relações entre os seres animados, ou não, humanos ou não. É o princípio de que toda ação tem uma reação, significando, em sua conotação jurídico-processual, que o responsável pela instauração do litígio, seja aquele ocupante do pólo passivo ou ativo da demanda (“a ordem dos fatores não altera o produto”), com o trânsito em julgado da decisão, arcará com os custos processuais calculados em cada caso concreto, e, também, com os custos atinentes aos honorários advocatícios pertencentes ao advogado da parte vencedora. Esse o sentido do princípio da causalidade entre os operadores do Direito, cuja fonte infraconstitucional é o art. 20 do Código de Processo Civil, dispositivo aplicável subsidiariamente sempre que não houver disposição de lei em sentido contrário. Mesmo a lei dispondo em sentido contrário, é preciso fazer a leitura deste princípio segundo o ordenamento jurídico constitucional vigente, eis que é este Código Supremo, o “Código dos Códigos”, de fato, sua verdadeira fonte, e não, como pode parecer à primeira vista, o art. 20 citado.
[23] A Lei 11.232, de 22 de dezembro de 2005, instituiu entre nós o “processo-sincrético”, aquele onde não há divisão, por meio de ação, entre o processo de conhecimento e o processo de execução, sendo o direito alegado processado em fase unitária, sincrética, inexistindo o ajuizamento de ação de execução para dar cabo ao processo de satisfação do direito anteriormente reconhecido mediante título executivo judicial. Visa à celeridade.
[24] Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, art. 3º: “Têm o Tribunal e todos os seus órgãos o tratamento de Egrégio e os seus membros, o de Excelência”.
[25] TJSP, 31ª Câm. de Direito Privado, AI 1.082.185-0/0 – Rel. Des. Carlos Nunes, Santo André–SP, j. 7/11/2006, votação unânime.
[26] Proc. 562.01.2002.046063-4, 8ª Vara Cível.
[27] Depois que a defesa demonstrou o direito, principalmente por prova documental oriunda de rescisão de contrato de trabalho e gastos com procedimento cirúrgico concomitantemente à execução, o d. juízo expediu mandado de levantamento. Assim, a quantia anteriormente penhorada (por meio da recente penhora “on line”) retornou ao patrimônio do executado sem que houvesse recurso de agravo de instrumento da parte contrária.
[28] Na redação determinada pela Lei 11.232, de 22 de dezembro de 2005.
[29] STJ, 3ª T., REsp nº 978.545-MG - Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 11/3/2008, votação unânime.
[30] Que derrogou os embargos à execução proveniente de título executivo judicial, segundo a citada Lei 11.232, de 2005.
[31] O qual sou mandatário, tendo sido contratado para patrociná-lo em ação judicial contra ele proposta.
[32] Cf. § 3º do art. 20 do Código de Processo Civil.
[33] TAVARES, 2002, p. 641.
[34] NERY JR., 2002, pp. 59/63.
[35] BARBOSA MOREIRA, 1971, pp. 238/247.
[36] BARBI, 2002, pp. 144/145.
[37] CAHALI, 1997, p. 1253.
[38] MANCUSO, RDP 77/110.
[39] JARDIM, RJ 240/23.
[40] RE 470.407/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 9-5-06, DJ de 13-10-06.
[41] Art. 100, § 1º-A, da Constituição Federal: “Os débitos de natureza alimentícia compreendem aqueles decorrentes de salários, vencimentos, proventos, pensões e suas complementações, benefícios previdenciários e indenizações por morte ou invalidez, fundadas na responsabilidade civil, em virtude de sentença transitada em julgado”.
[42] DINAMARCO, 2004, pp. 698/699.
[43] BONAVIDES, 2006, pp. 255/295.
[44] AFONSO DA SILVA, 2003, pp. 440/455.
[45] Rumo tomado por diversas reformas instituídas na lei infraconstitucional e mesmo na Constituição da República, algumas delas discutidas, aliás, em meu ensaio “REPERCUSSÃO GERAL, SÚMULA VINCULANTE E AUTOS VIRTUAIS. NOVAS PERSPECTIVAS DE EFETIVIDADE NO PROCESSO CIVIL CONSTITUCIONAL” (DINAMARCO, Revista Jus Vigilantibus. Disponível em: <http://jusvi.com/artigos/27789/>. Acesso em: 25 de jun. 2008).
[46] Precatório esse que se submete à fila especial em condenações judiciais de ação de alimentos, proveniente de ato ilícito, de direito de família ou mesmo a decorrente do direito do profissional advogado nas hipóteses de condenação da Fazenda Pública por força do art. 100, § 1º-A, da Constituição Federal.
[47] A Lei 11.101, de 9 de fevereiro de 2005, dispôs sobre a recuperação judicial, extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária, revogando expressamente o Decreto-Lei 7.661, de 21 de junho de 1945, que previa a vetusta “concordata”; v., ainda, o art. 2º da LICC e Lei Complementar 95/98.
[48] Sistemática que se compatibiliza com o inc. LXXVIII do art. 5º da Constituição na redação determinada pela emenda constitucional 45/04: “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”.
[49] Art. 267, inc. VI, do Código de Processo Civil, na redação determinada pela Lei 11.232, de 2005.
[50] Art. 2º do Decreto-Lei 4.657, de 4 de setembro de 1942 (Lei de Introdução ao Código Civil).
[51] Ou seja, o “princípio da causalidade” em mandado de segurança decorrente de condenação judicial, concedida a ordem. Ainda que sujeita ao duplo grau de jurisdição – recurso ex officio ou remessa necessária/oficial, art. 12, parágrafo único, da Lei 1.533/51 – a decisão que concede a ordem de segurança pleiteada pelo impetrante pode ser executada provisoriamente, sem o que haveria ofensa à utilidade e adequação do procedimento. O tempo do processo não pode prejudicar aquele que tem razão beneficiando aquele que não tem, uma das justificativas encontradas pela “tutela antecipada punitiva” prevista no inc. II do art. 273 do Código de Processo Civil, dando tutela ao direito, destarte, mediante decisão provisória e incidental no curso do processo.
[52] “É sem dúvida relevante do ponto de vista econômico, a dúvida sobre a constitucionalidade de determinado tributo; do ponto de vista político, questão que interfira de modo profundo na atuação dos partidos, ou que diga respeito às relações do Brasil com outros Estados ou com organismos internacionais; do ponto de vista social, questão relativa à proteção de direitos e interesses de vastas camadas da população, sobretudo das mais carentes, e notadamente em processos coletivos; do ponto de vista jurídico, questão concernente à definição de instituto fundamental do ordenamento brasileiro, ou à divisão de competência entre a União e os Estados-membros para legislar sobre certa matéria. Com freqüência, a repercussão geral poderá manifestar-se em mais de um campo dentre os mencionados no § 1º; eles não são reciprocamente excludentes” (BARBOSA MOREIRA, 2008, p. 618).
[53] Art. 543-A, § 1.º, da Lei 11.418, de 19 de dezembro de 2006, acrescido ao CPC pelo art. 2.º da lei especial no objetivo de regulamentar o § 3.º do art. 102 da Constituição Federal.
[54] Cf. DIDIER JR., CARNEIRO DA CUNHA, 2007, pp. 267/273 e MARINONI, ARENHART, 2007, pp. 565/569.
[55] Consulta realizada no site do Supremo Tribunal Federal. Disponível em: <http://www.stf.gov.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=91505>. Acesso em: 18 de jun. 2008.
[56] Apesar de que é imutável quando se tratar de objeto de deliberação a emenda tendente a abolir: a forma federativa de Estado; o voto direto, secreto, universal e periódico; a separação dos Poderes; e os direitos e garantias individuais, segundo dicção expressa dos incs. I, II, III e IV do § 4º do art. 60 da Constituição Federal.
[57] BARBOSA MOREIRA, 2008, pp. 4/5.
[58] Redação determinada pelo art. 2.º da Lei 11.276, de 7 de fevereiro de 2006.
[59] BARBOSA MOREIRA, 2008, p. 460.
[60] BARBOSA MOREIRA, 2007, p. 306.
[61] Art. 543-C. Quando houver multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica questão de direito, o recurso especial será processado nos termos deste artigo. § 1º Caberá ao presidente do tribunal de origem admitir um ou mais recursos representativos da controvérsia, os quais serão encaminhados ao Superior Tribunal de Justiça, ficando suspensos os demais recursos especiais até o pronunciamento definitivo do Superior Tribunal de Justiça. § 2º Não adotada a providência descrita no § 1º deste artigo, o relator no Superior Tribunal de Justiça, ao identificar que sobre a controvérsia já existe jurisprudência dominante ou que a matéria já está afeta ao colegiado, poderá determinar a suspensão, nos tribunais de segunda instância, dos recursos nos quais a controvérsia esteja estabelecida. § 3º O relator poderá solicitar informações, a serem prestadas no prazo de quinze dias, aos tribunais federais ou estaduais a respeito da controvérsia. § 4º O relator, conforme dispuser o regimento interno do Superior Tribunal de Justiça e considerando a relevância da matéria, poderá admitir manifestação de pessoas, órgãos ou entidades com interesse na controvérsia. § 5º Recebidas as informações e, se for o caso, após cumprido o disposto no § 4º deste artigo, terá vista o Ministério Público pelo prazo de quinze dias. § 6º Transcorrido o prazo para o Ministério Público e remetida cópia do relatório aos demais Ministros, o processo será incluído em pauta na seção ou na Corte Especial, devendo ser julgado com preferência sobre os demais feitos, ressalvados os que envolvam réu preso e os pedidos de habeas corpus. § 7º Publicado o acórdão do Superior Tribunal de Justiça, os recursos especiais sobrestados na origem: I - terão seguimento denegado na hipótese de o acórdão recorrido coincidir com a orientação do Superior Tribunal de Justiça; ou II - serão novamente examinados pelo tribunal de origem na hipótese de o acórdão recorrido divergir da orientação do Superior Tribunal de Justiça. § 8º Na hipótese prevista no inciso II do § 7º deste artigo, mantida a decisão divergente pelo tribunal de origem, far-se-á o exame de admissibilidade do recurso especial. § 9º O Superior Tribunal de Justiça e os tribunais de segunda instância regulamentarão, no âmbito de suas competências, os procedimentos relativos ao processamento e julgamento do recurso especial nos casos previstos neste artigo. Art. 2º Aplica-se o disposto nesta Lei aos recursos já interpostos por ocasião da sua entrada em vigor. Art. 3º Esta Lei entra em vigor 90 (noventa) dias após a data de sua publicação. Brasília, 8 de maio de 2008; 187º da Independência e 120º da República.
[62] Vide meu ensaio “DIREITO PROCESSUAL CONSTITUCIONAL EM ESPÉCIE”, onde desenvolvi temas polêmicos como a “relativização” da coisa julgada, repercussão geral “infraconstitucional” no STJ e “critérios de seleção” no processamento de recursos extraordinários “paradigmas” para o STF, onde consta a seguinte passagem: “Noto, por fim, que o § 1º do art. 543-C, instituído pela Lei 11.672, reproduziu o conteúdo do § 1º do art. 543-B, visando criar ‘critérios para o envio de determinados recursos extraordinários, pelo tribunal a quo, e o sobrestamento de outros, da mesma natureza’, podendo ser aplicado quanto ao procedimento de amostragem da ‘repercussão geral infraconstitucional’ perante o Superior Tribunal de Justiça nos recursos especiais a triagem dos recursos exercida pelo tribunal a quo. Ao Supremo Tribunal Federal, nas hipóteses em que opera a admissibilidade objetiva, quanto à repercussão geral (constitucional), nos recursos extraordinários, guardar-se-á as devidas proporções, prescritas em dispositivo próprio” (DINAMARCO, Revista Jus Vigilantibus. Disponível em: < http://jusvi.com/artigos/33916>. Acesso em: 9 de jun. 2008).
[63] Consubstanciado pelo art. 5º, inc. XXXV, da Constituição Federal.
[64] Contrário ao instituto, v. STRECK, 2006, pp. 395/434.
[65] Possibilidade autorizada implicitamente pelo art. 2º da Lei 11.417.
[66] BARBOSA MOREIRA, 2007, pp. 27/28.
[67] Cf. súmula 648 do Supremo Tribunal Federal.
[68] Parece assustadora minha afirmação, mas se emenda constitucional volta e meia é declarada inconstitucional pelo STF, não fica fora do arco da TEORIA DA CONSTITUCIONALIDADE e seus meios de controle, eventual súmula vinculante que, em futuro próximo, possa ser lida como inconstitucional. Imagine-se radical evolução interpretativa da Corte a respeito de determinado instituto (mutação constitucional), ou, não só isso, derrogação na composição de seus membros, cada qual com o seu modo de enxergar o mundo lá fora (e “quanta vida” há lá fora!), admitindo, pois, a inconstitucionalidade de súmula editada com base na Lei 11.417/2006; sobre “mutação constitucional”, v. meu ensaio “MUTAÇÃO CONSTITUCIONAL COMO PRESSUPOSTO DA REPERCUSSÃO GERAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO” (DINAMARCO, Clube Jurídico do Brasil. Disponível em: <http://www.clubjus.com.br//?artigos&ver=2.14215/>. Acesso em: 25 de jun. 2008).
[69] “Salvo disposição em contrário, a lei revogada não se restaura por ter a lei revogadora perdido a vigência” (§ 3º do art. 2º da LICC). De lege lata, pode-se ler o § 3º, cit., da seguinte forma: “Salvo disposição em contrário, a súmula revogada não se restaura por ter a súmulav. a Lei 11.417, de 19.12.2006). revogadora perdido a vigência” (
[70] BARBOSA MOREIRA, 2007, p. 304.
[71] DINAMARCO, Revista Jus Vigilantibus. Disponível em: <http://jusvi.com/artigos/30510/>. Acesso em: 25 de jun. 2008.
[72] Consulta realizada no site do Supremo Tribunal Federal. Disponível em: <http://www.stf.gov.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=91562>. Acesso em: 18 de jun. 2008.
[73] Súmula vinculante nº 1: “Ofende a garantia constitucional do ato jurídico perfeito a decisão que, sem ponderar as circunstâncias do caso concreto, desconsidera a validez e a eficácia de acordo constante de termo de adesão instituído pela Lei Complementar 110/2001”; súmula vinculante nº 2: “É inconstitucional a Lei ou Ato Normativo Estadual ou Distrital que disponha sobre sistemas de consórcios e sorteios, inclusive bingos e loterias”; súmula vinculante nº 3: “Nos processos perante o Tribunal de Contas da União asseguram-se o contraditório e a ampla defesa quando da decisão puder resultar anulação ou revogação de ato administrativo que beneficie o interessado, excetuada a apreciação da legalidade do ato de concessão inicial de aposentadoria, reforma e pensão”; súmula vinculante nº 4: “Salvo nos casos previstos na Constituição, o salário mínimo não pode ser usado como indexador de base de cálculo de vantagem de servidor público ou de empregado, nem ser substituído por decisão judicial”; súmula vinculante nº 5: “A falta de defesa técnica por advogado no processo administrativo disciplinar não ofende a Constituição”; súmula vinculante nº 6: “Não viola a Constituição o estabelecimento de remuneração inferior ao salário mínimo para as Praças prestadoras de serviço militar inicial”; súmula vinculante nº 7: “A norma do parágrafo 3º do artigo 192 da Constituição, revogada pela Emenda Constitucional 40/2003, que limitava a taxa de juros reais a 12% ao ano, tinha sua aplicabilidade condicionada à edição de lei complementar”; súmula vinculante nº 8: “São inconstitucionais os parágrafo único do artigo 5º do Decreto-lei 1569/77 e os artigos 45 e 46 da Lei 8.212/91, que tratam de prescrição e decadência de crédito tributário”; súmula vinculante nº 9: “O disposto no artigo 127 da Lei 7.210/84 foi recebido pela ordem constitucional vigente e não se lhe aplica o limite temporal previsto no caput do artigo 58”; súmula vinculante nº 10: “Viola a cláusula de reserva de plenário (CF, art. 97) a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público, afasta a sua incidência no todo ou em parte”.
[74] Consulta realizada no site do Supremo Tribunal Federal. Disponível em: <http://www.stf.gov.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=91231>. Acesso em: 18 de jun. 2008.
[75] No ensaio “SÚMULA, JURISPRUDÊNCIA, PRECEDENTE: UMA ESCALADA E SEUS RISCOS”, Barbosa Moreira, com ironia, indaga e pondera: “Que pensar dos novos projetos, em tramitação no Congresso Nacional? As referências feitas oportunamente (supra, nº 4) evidenciam que se tenciona ampliar o transbordamento; as margens fixadas pela Emenda Constitucional nº 45 afiguram-se estreitas demais aos reformadores. Caricaturando um pouco (mas só um pouco), dia virá em que, a vingarem todas as propostas veiculadas – e outras que decerto estarão por vir, sempre no mesmo rumo -, teremos dificuldades em identificar algum caso em que não haja vinculação e se conceda a juízes e tribunais, por especial favor, a liberdade de julgar de acordo com seu próprio convencimento...” (BARBOSA MOREIRA, 2007, pp. 307/308).
[76] Compatibilidade material, significando hierarquia vertical na interpretação do texto constitucional: do ato normativo, da lei ordinária/complementar, da emenda constitucional etc. à Constituição, nunca o contrário sob o grave risco de inverter a lógica do sistema normativo inspirado no principal ideólogo do Positivismo, HANS KELSEN.
[77] Sem se esquecer de outros legitimados passivos em mandado de segurança previstos no § 1º do art. 1º da Lei 1.533/51, e no inc. LXIX do art. 5º da Constituição de 1988.
[78] TAVARES, 2007, p. 81.
[79] TAVARES, 2007, p. 82.
[80] TAVARES, 2007, pp. 82/83.
[81] Cf. BONAVIDES, 2006, pp. 296/343.
[82] DJ de 10/12/1969, p. 5932; DJ de 11/12/1969, p. 5948; DJ de 12/12/1969, p. 5996.
[83] Consulta realizada no site do Supremo Tribunal Federal. Disponível em: <http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=512.NUME.%20NAO%20S.FLSV.&base=baseSumulas>. Acesso em: 26 de jun. 2008.
[84] Consulta realizada no site do Superior Tribunal de Justiça. Disponível em: <http://www.stj.jus.br/SCON/sumulas/doc.jsp?livre=%40docn&&b=SUMU&p=true&t=&l=10&i=249>. Acesso em: 26 de jun. 2008.
[85] Cf. art. 2º da Lei 9.868/99.
[86] Cf. inc. I do art. 3º da Lei 9.868/99.
[87] LENZA, 2008, pp. 159/160.
[88] CUNHA JÚNIOR, 2007, p. 190.
[89] LENZA, 2008, p. 159.
[90] Cf. inc. III do art. 59 da Constituição da República do Brasil, verbi gratia.
[91] LENZA, 2008, p. 146.
[92] CUNHA JÚNIOR, 2007, p. 101.
[93] DI PIETRO, 2006, p. 201.
[94] DI PIETRO, 2006, p. 233.
[95] Cf. MEIRELLES, 2002, p. 174 e BANDEIRA DE MELLO, 2002, pp. 333/427.
[96] Cf. Gilmar Mendes, 2007, p. 56.
[97] Dispõe sobre o processo e julgamento da argüição de descumprimento de preceito fundamental, nos termos do § 1º do art. 102 da Constituição Federal de 1988.
[98] Mesmo sem conceituar o que vem a ser “preceito fundamental”, uma vez que o papel da Lei não é, em regra, o de conceituar os institutos (interpretação autêntica), se extrai que o cabimento da ADPF se limita, nos termos do art. 1º, caput, da Lei 9.882, à alegada inconstitucionalidade da norma, cujo parâmetro de controle é o “direito pré-constitucional” tido por contrário ao texto constitucional, dando ensejo, ainda, à discussão no sentido de se saber se seu cabimento se dá estritamente mediante o cotejo entre os direitos fundamentais (cláusula jurídica indeterminada) previstos na Constituição ou se pode ser admitido em face de todo o texto constitucional, o que, a princípio, não resolve o problema. Àqueles que lêem o instituto de forma restrita, talvez contrarie justamente sua prerrogativa de espécie de controle de constitucionalidade subsidiário, consideração sobre a qual indago se o que é subsidiário pode ser restrito, pois o que é subsidiário é residual e o que é residual abrange o todo, ou seja, o todo constitucional.
[99] Foi vetado pelo Presidente da República o inc. II do parágrafo único do art. 1º da Lei 9.882, nos termos do § 1º do art. 66 da Constituição Federal.
[100] Note-se a menção expressa a “ato normativo” no texto da Lei.
[101] “A primeira questão que se levanta com respeito à teoria dos direitos fundamentais é a seguinte: podem as expressões direitos humanos, direitos do homem e direitos fundamentais ser usadas indiferentemente? Temos visto nesse tocante o uso promíscuo de tais denominações na literatura jurídica, ocorrendo porém o emprego mais freqüente de direitos humanos e direitos do homem entre autores anglo-americanos e latinos, em coerência aliás com a tradição e a história, enquanto a expressão direitos fundamentais parece ficar circunscrita à preferência dos publicistas alemães” (BONAVIDES, 2006, pp. 560/578 e pp. 579/647).
[102] MENDES, 2007, p. 56.
[103] MENDES, 2007, p. 80.
[104] TAVARES, 2002, p. 152.
[105] LENZA, 2008, p. 215.
[106] MORAES, 2007, p. 757.
[107] Apud LENZA, 2008, pp. 215/216.
[108] TAVARES, 2002, p. 252.
[109] TAVARES, 2002, pp. 253/255.
[110] O autor não deixa claro quem é o “idealizador” da Lei 9.882 porque faz citação na nota de rodapé 510 aos eminentes Celso Ribeiro Bastos e Alexis Galiás de Souza Vargas, co-autores de ensaio publicado na Revista Jurídica Virtual, nº 08, jan., 2000, fazendo citação, além disso, ao não menos eminente Gilmar Ferreira Mendes, com ensaio publicado na mesma Revista, n. 7, o que pode indicar, entretanto, ser Celso Bastos o idealizador: depois de citar o jurista, em “primeira mão” e com destaque em “negrito”, vem a citação “nesse sentido” ao ministro Gilmar Mendes, hipótese em que a topologia pode significar a intenção transmitida pelo autor, dando preferência à fonte mencionada em primeiro lugar e em sentido secundário, mas sem menosprezo, à posterior citação.
[111] CUNHA JÚNIOR, 2007, pp. 265/266.
[112] Na redação determinada pela Lei 11.672, de 2008.
[113] Ainda que se possa tacitamente tirar do próprio controle da legalidade/constitucionalidade que exercem os tribunais superiores perante os demais órgãos do Poder Judiciário e mesmo sobre a Administração Pública, citando como exemplos a jurisprudência dominante destas Cortes e também suas respectivas súmulas, mesmo as que foram editadas sem a força vinculante instituída pela Lei 11.417 ao regulamentar o art. 103-A da Constituição Federal na redação determinada pela emenda constitucional 45/2004.
[114] Constituído ou de Segundo Grau. Sobre o PODER CONSTITUINTE (BONAVIDES, 2006, pp. 141/169).
[115] Vide meu ensaio “DIREITO PROCESSUAL CONSTITUCIONAL EM ESPÉCIE”, cit., p. 28.
[116] Significando, pela leitura que a doutrina faz sobre a expressão, “onde há a mesma razão, há o mesmo direito”.
[117] BONAVIDES, 2006, p. 294.
[118] AFONSO DA SILVA, 2003, p. 92.
[119] BANDEIRA DE MELLO, 2002, pp. 807/808.
[120] BRITTO, 2006, p. 171.
[121] BRITTO, 2006, pp. 171/172.
[122] BARROSO, 2008, p. 151.
[123] BARROSO, 2008, p. 153.
[124] De início, afirmar a inconstitucionalidade das súmulas 105 e 512, pelo fato da nítida “proteção aos cofres públicos”, parece ser contraditório de minha parte. Se boa parte da tutela jurisdicional recai sobre o dinheiro público, não há qualquer violação à Constituição e nem da lei infraconstitucional, pode-se defender com olhar apressado. Ocorre que estes atos normativos se chocam com valores também previstos na própria Constituição, havendo necessidade de avaliar qual norma deve ser aplicada e qual deve ser preterida, não restando muitas dúvidas ao intérprete, uma vez que além de ignorar o processo legislativo previsto no art. 59 do texto constitucional, tais súmulas caem no pecado de tutelar o “interesse público secundário” das pessoas jurídicas de direito público e de seus órgãos diretos e/ou indiretos da Administração Pública, inclusive os Consórcios Públicos e as Parcerias Público-Privadas, contrariando, e muito, o que seria tutelar verdadeiramente o dinheiro público, arcado “a duras penas” pelos contribuintes sem que sintam proporcionalmente a contraprestação de bens e serviços do Estado Social. Esse motivo, por si só, já seria suficiente para se declarar a inconstitucionalidade material das súmulas 105 e 512, cit.
[125] Cf. notas de rodapé 25, 26, 27, 28 e 29, p. 13.
[126] STJ, 3ª T., REsp nº 978.545-MG - Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 11/3/2008, votação unânime.
[127] DINAMARCO, Clube Jurídico do Brasil, 2008. Disponível em: <http://www.clubjus.com.br/?artigos&ver=2.14091>. Acesso em: 26 de jun. 2008.
[128] DINAMARCO, 2007, p. 25.
[129] DINAMARCO, 2007, p. 25.
[130] Cf. inc. IX do art. 93 da Constituição Federal na redação da emenda constitucional 45/04: “todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação”; cf. o art. 131 do CPC, assegurando ao juiz o “livre convencimento motivado” na apreciação das provas, ainda que os fatos e circunstâncias não sejam alegados pelas partes, podendo agir, inclusive, de ofício, excepcionando a regra ne procedat iudex ex officio.
[131] Direito Constitucional, Processual Civil, Administrativo etc.
[132] FERRAZ JR., 2001, p. 21.
[133] Cf. nota de rodapé 34.
[134] Com efeitos vinculantes e erga omnes, atingindo todos os indivíduos, sem distinção.
[135] Hipótese em que não haverá efeitos vinculantes e erga omnes. Os efeitos da decisão transitada em julgado serão, portanto, restritos às partes do caso concreto.
[136] Sempre neguei a adjetivação “autarquia especial” com relação à Ordem dos Advogados do Brasil, o que pode ser conferido no seguinte ensaio: DINAMARCO, Clube Jurídico do Brasil, 2007. Disponível em: <http://www.clubjus.com.br/?artigos&ver=2.12331>. Acesso em: 24 de jun. 2008.
[137] Cf. inc. VII do art. 103 da Constituição Federal de 1988, abstraindo-se aqui da discussão sobre a qualidade deste co-legitimado no ajuizamento da ADI e ADC, se é “legitimado especial” ou “legitimado universal”, questão que ultrapassa os objetivos almejados.
[138] Em sua conotação pejorativa, vil, desprezível, lados da moeda tão conhecidos pelo povo brasileiro.
Advogado, pós-graduado em Direito Processual Civil e Pós-Graduando em Direito Processual Constitucional, na Universidade Católica de Santos/SP
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: DINAMARCO, Tassus. Controle Concentrado/Difuso de Constitucionalidade? Em ato normativo (de Tribunal)? Tendo como objeto Súmula "simples"? Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 06 out 2008, 14:46. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos /15122/controle-concentrado-difuso-de-constitucionalidade-em-ato-normativo-de-tribunal-tendo-como-objeto-sumula-quot-simples-quot. Acesso em: 28 dez 2024.
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